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As musas crepusculares da música negra

Tem divas que, por uma circunstância ou por outra, a gente só descobre na madurez. Não acompanhamos suas faces, seus corpos, suas vozes se modificando com o passar dos anos. Quando elas chegam até nós, não são ninfas, mas deusas. Damas da música que encantam e seduzem com a profundidade de quem carrega dores, alegrias, […]

Cynara Menezes
18 de novembro de 2012, 12h19

Tem divas que, por uma circunstância ou por outra, a gente só descobre na madurez. Não acompanhamos suas faces, seus corpos, suas vozes se modificando com o passar dos anos. Quando elas chegam até nós, não são ninfas, mas deusas. Damas da música que encantam e seduzem com a profundidade de quem carrega dores, alegrias, amores, história.

Cesária Évora (1941-2011)

Essa cabo-verdiana só ficou conhecida internacionalmente aos 47 anos, em 1988. Havia começado a cantar desde menina, mas aos 30 e poucos se desgostou de tudo e largou a música. Felizmente para nós, voltou a cantar e se tornou a intérprete mais reconhecida de seu pequeno país. Petit Pays, aliás, é uma das minhas canções favoritas de Cesária.

Edith do Prato (1916-2009)

Dona Edith do Prato, baiana de Santo Amaro da Purificação, chegou a participar do disco Araçá Azul, de Caetano Veloso, em 1973, cantando Viola Meu Bem. Mas só foi gravar seu primeiro (e único) CD aos 86 anos, em  2002. Ficaria só mais sete anos entre nós. É um disco maravilhoso, com uma percussão irresistível e a voz de dona Edith, sempre tocando seu pratinho com uma faca, acompanhada do coral “Vozes da Purificação”, e por Caetano e Maria Bethânia. Legítimo samba-de-roda do recôncavo baiano.

http://youtu.be/bP741JEtb4I

Omara Portuondo (1930)

Se tem uma coisa que não perdoo ao regime de Fidel Castro em Cuba foi haver permitido que os músicos do Buena Vista Social Club permanecessem desconhecidos do mundo durante anos… Imaginem que se não fosse pelo álbum gravado por Ry Cooder, em 1996, e o documentário de Wim Wenders, de 1999, eles estariam no esquecimento até hoje! Eu odiaria saber que vivi sem ter ouvido Omara Portuondo e Ibrahim Ferrer cantando Silencio.

Lia de Itamaracá (1944)

A cirandeira pernambucana Lia de Itamaracá só foi apresentada ao Brasil inteiro aos 54 anos, em 1998. É uma gigante de ébano de 1m80 de altura capaz de levar a platéia de seus shows ao delírio. É impossível não dançar ao ouvir esta mulher, suas apresentações ao vivo são imperdíveis. É ela a Lia que a compositora Teca Calazans homenageou, nos anos 60, com o verso: “Esta ciranda quem me deu foi Lia, que mora na ilha de Itamaracá”.

Clementina de Jesus, brazilian composer and singer. Afro-descendant elderly woman, cultural traditions.

A fluminense Clementina de Jesus (1901-1987) trabalhou como empregada doméstica durante 20 anos, até ser descoberta pelo pelo compositor Hermínio Bello de Carvalho em 1963. Aprendera com a mãe, lavadeira, lundus, jongos, cantos de escravos. A grande Quelé morreu como nasceu: pobre, aos 85 anos.

 

 

 


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(8) comentários Escrever comentário

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Aemiguel em 18/11/2012 - 13h51 comentou:

Omara e Ibrahim Ferrer – momento sublime.

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mario cezar em 18/11/2012 - 14h37 comentou:

cynara, bela, muy bela homenagem a essas deusas de ébano; essas vozes que foram além da brutalidade cotidiana; que fincaram acordes ; arco de estrelas a nos guiar; a dizer o modo como o vento espraia. na próxima lista acrescente clementina de jesus. alaide costa. a velha guarda da portela. e as deusas americanas. ébanos de veludo. aquelas flores de carmin. negras. ali são tantas. espero , que o fato de fincar o nome socialismo (essa utopia pinçada de idealismos e fantasias, afinal, cynara, o homem é um bicho bruto, regido por perversões e o caminho da morte é por dentro. é da natureza) sai um pouco de tua intenção, da tua beleza arrupiada e desencantada e ai entra a arte. este modo de operar, de deglutir os desconjuros e ser sublime. e encantar. a arte é o caminho que o diga a voz de milton nascimento

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mario cezar em 18/11/2012 - 22h56 comentou:

cynara(retorno como quem apanha um pólen) e diante de teu olho que se arregala para algum modo de beleza, não compartimentemos tanto a música em função da caractística da pele. que a goela prenhe de cantiga seja bela. e pronto. basta que a música arrepie e esboce dentro da alma uma aleluia. e pronto. digo assim, porque ouvir(por ex) o disco "renascer" de nana caymmi ou o disco "fatal" de gal costa sob os auspicios da guitarra de lanny gordim. ou entonce a voz de tetti no disco do pessoal do ceará , cujo título: " meu corpo minha embalagem todo gasto na viagem" conhece esse disco(uma cocada de carmin, tal a beleza) comece pela música"ingazeiras" que é uma homenagem do grande ednardo ao artista aldemir martins que nasceu num sítio de mesmo nome

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Alessandra Matos em 19/11/2012 - 13h38 comentou:

O POETA DISSE QUE AS ¨COISAS LINDAS ESSAS FICARÃO¨. ESSAS DEUSAS FICARÃO. SÃO LINDA E ENCANTADAS, DEIXANDO SEUS ENCANTOS NOS CORAÇÕES DE QUEM AS OUVEM….

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Paloma Varón em 20/11/2012 - 20h21 comentou:

Fiquei tão feliz de já ter visto todas estas divas ao vivo. E triste, porque não sabia que Edith do Prato tinha morrido. Quando morava em São Paulo e batia o banzo, eu me pegava cantarolando cantarolando aquele trecho "Eu trabalho o ano inteiro/ Na estiva de São Paulo/ S[ó pra passar/ Fevereiro em Santo Amaro".
Você está demais com suas homenagens e textos hoje, Cynara!
Beijos

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    morenasol em 20/11/2012 - 20h35 comentou:

    palomita querida, quase todo fim-de-semana eu ouço o disco de edith do prato ; )

Guilherme Aglio em 28/11/2012 - 16h06 comentou:

Cynara, eu acho que a sulafricana Miriam Makeba merecia estar nessa sua lista. Fez muito sucesso nas paradas americanas cantando jazz / blues. Ela era casada com o ativista do Black Panthers americano, foi super premiada na ONU quando morou na Guiné por seus trabalhos de paz.

Ela tem uma música chamada "A Luta Continua", que fez em Moçambique. O Sivuca tocava com ela, inclusive. Morreu a alguns anos, infelizmente.

Linda história a dela…

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lenir vicente em 19/11/2013 - 17h01 comentou:

Concordo com Guilherme. Faltou a grande Makeba com seu gingado e sua voz possante.Uma das primeiras a levar para o mundo e popularizar a música da África. Mas as deusas ficarão gravadas na memória, pois são raízes e raízes não se perdem , nem com o passar dos séculos

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