Socialista Morena
Mídia

A censura do Estado espanhol aos independentistas catalães

Inspeções policiais, fechamento de sites  – incluindo a página oficial do referendo –  e restrição de envios pelo correio são alguns dos casos de limitação da liberdade de expressão e imprensa

"Pela liberdade de imprensa e por todas as liberdades"
Gi Lanzetta
21 de setembro de 2017, 20h13

O Estado espanhol intensifica a ofensiva para impedir o referendo independentista na Catalunha  – aprovado pelo Parlamento catalão e suspenso pelo Tribunal Constitucional espanhol–, que acontece no dia 1º de outubro.

Inspeções policiais, visita da Guarda Civil espanhola a diversas redações para comunicar a proibição de veicular anúncios relacionados ao referendo, fechamento de sites  (inclusive a página oficial do referendo ) , advertência a diretores de meios de comunicação e proibição de atos públicos são alguns dos casos de limitação da liberdade de expressão e imprensa que vêm aumentando conforme se aproxima a data da votação.

O aviso na página censurada do referendo

No dia 9 de setembro, o semanário El Vallenc comunicou que agentes armados da Guarda Civil espanhola haviam inspecionado a redação do jornal durante mais de 5 horas em busca de provas da impressão de materiais relacionados ao referendo. O jornal qualificou a vistoria policial como “uma fiscalização sem precedentes”. A inspeção ocorreu no mesmo dia em que a Guarda Civil começou as vistorias nas gráficas para recolher quaisquer materiais que fizessem publicidade da votação.

A Guarda Civil espanhola também entrou na redação do jornal NacióDigital para entregar a interlocutória do Tribunal Superior de Justiça da Catalunha (TSJC). O diretor do canal de televisão TV3, Vicent Sanchis, foi notificado. Os agentes estiveram ainda nas redações do El Punt AvuiVilawebEl Nacional e Racó Català. Os policiais inspecionaram os meios de comunicação que publicaram publicidade institucional do referendo e que receberam a notificação do TSJC. Todas as notificações se devem a que o referendo é considerado ilegal depois que o Tribunal Constitucional espanhol o suspendeu.

O Colégio de Jornalistas da Catalunha denuncia a dificuldade de exercer o jornalismo na situação que vive a região: “os últimos acontecimentos limitam a missão principal dos meios de comunicação: informar com plena liberdade”

Uma semana depois, no dia 15, a entidade Òmnium Cultural denunciou que os Correos não haviam feito a distribuição da edição de setembro de sua revista que trazia na capa a palavra “Democracia”, cujo tema deste mês era o Dia Nacional da Catalunha, celebrado no dia 11 de setembro. O presidente da entidade, Jordi Cuixart, assegurou que a entidade não dará nenhum passo atrás na defesa da democracia. “Podem confiscar a nossa revista, mas não a vontade de 70 mil sócios de uma entidade com mais de 50 anos de história que resistiu ao franquismo”, comunicou, na página web da associação.

Poucos dias depois, a publicação Poble LLiure também denunciou que a empresa estatal de entregas havia bloqueado o envio da sua revista devido a “conteúdos relacionados ao referendo”.

Segundo uma circular interna, a direção dos Correos teria informado que, em cumprimento da lei, os funcionários deste serviço de entrega devem abster-se de tramitar qualquer tipo de envio relacionado com o referendo de independência. A empresa estatal de entregas é fundamental para o emissão de materiais relacionado a votação de outubro, como por exemplo de material publicitário, informativos e cédulas de votação.

A circular interna dos Correos proibindo qualquer envio relativo ao referendo

No dia 16, um redator do jornal Nació Digital teve o celular apreendido à força por policiais da cidade de Sitges  –município catalão a 40 km da cidade de Barcelona – quando cobria um ato do referendo. Os policiais obrigaram-no a se identificar e a deixar de gravar o evento.

Além das inspeções aos meios de comunicação, a justiça espanhola também impede a publicidade do referendo na internet. Uma ordem judicial emitida no dia 15 de setembro ordenou aos operadores de telecomunicações a inabilitação de acesso aos domínios utilizados para divulgar o referendo, incluindo a página web oficial. Imediatamente, o presidente do Governo catalão, Carles Puigdemont, anunciou que o sitio voltaria a funcionar em outro domínio. Pouco tempo depois, a nova página saiu do ar. A cada novo domínio criado pelo Governo catalão a Guarda Civil se apressava para fechá-los. Surgiram, então, domínios alternativos, como o www.referendum.party ou o www.referendum.ninja, que permanecem ativos.

Entre 9 e 15 de setembro, foram incorporados ao mapa da censura 17 novos casos relacionados com o referendo. No total, já são mais de 50 casos notificados

Diante dos bloqueios, o Governo catalão criou a conta no twitter @ref1oct, que também segue ativa e se dedica a informar como burlar os bloqueios para acessar às páginas do referendo.

Uma iniciativa do Observatori Mèdia.cat mapeia os casos relacionados às limitações à liberdade de expressão. O mapa da censura visibiliza os casos de censura, agressões a jornalistas ou meios de comunicação e restrições a expressões artísticas ou acadêmicas na Catalunha e em outras regiões da Espanha. Os casos de restrições relacionadas ao referendo de outubro foram destacados no mapa com uma estrela. Dos dias 9 a 15 de setembro, foram incorporados ao mapa 17 novos casos relativos à votação do dia 1º de outubro e, no total, já são mais de 50 casos notificados até hoje.

O Colégio de Jornalistas da Catalunha denuncia a dificuldade de exercer o jornalismo na situação jurídico-política que vive a região, já que “os últimos acontecimentos limitam ou condicionam a missão principal dos meios de comunicação: informar com plena liberdade e sem coações”. A associação também acrescenta que a liberdade de imprensa “é o principio básico de qualquer sociedade democrática e que não pode ser afetado pelos acontecimentos políticos e sociais do país”.

Um manifesto em defesa da liberdade de imprensa e por todas as liberdades já conta com mais de 2 mil assinaturas de jornalistas, entidades e organizações. A iniciativa foi criada pelo Grupo de Jornalistas Ramon Barnils junto com diversas associações e sindicatos de comunicação, jornalismo e publicidade.

Texto publicado originalmente na página da autora no Medium

 

 

 

 

 


(7) comentários Escrever comentário

Os comentários aqui postados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião da Socialista Morena. Todos as mensagens são moderadas. Não serão aceitos comentários com ofensas, com links externos ao site, e em letras maiúsculas. Em casos de ofensas pessoais, preconceituosas, ou que incitem o ódio e a violência, denuncie.

Rogério Tomaz Jr. em 21/09/2017 - 23h53 comentou:

Muito esclarecedor para se compreender o grau e a profundidade da repressão.

Responder

iurutaí em 22/09/2017 - 15h32 comentou:

Replicando o título de matéria anterior do site: E SE FOSSE NA VENEZUELA?

Responder

Policarpo em 22/09/2017 - 23h03 comentou:

Vou insistir: o blog tem optado por colocar de uma maneira bastante parcial, pouco plural e, algumas vezes, de uma forma bastante maniqueísta a questão catalã e o tema independentista. Coloco abaixo alguns videos que ajudam ilustrar a complexidade da discussão em torno desses temas.
Jordi Evole, craque do jornalismo espanhol (ele mesmo catalão) de fina ironia entrevistando Jordi Pujol mais importante lider do nacionalismo catalão e Arthur Más que meteu Cataluna nessa rota política de confronto que se vive agora.
https://www.youtube.com/watch?v=EJrgDCxbDho
https://www.youtube.com/watch?v=BNN554lYCSs
https://www.youtube.com/watch?v=jUKuwmVNzaI
https://www.youtube.com/watch?v=ZFc6KegUAdg
Julio Anguita, histórico dirigente político da esquerda espanhola que abandonou o PSOE e criou a Esquerda Unida depois da decisiva votação da entrada da Espanha na OTAN.
https://www.youtube.com/watch?v=y8guF4lV5js

Vale a pena acompanhar os programas de Jordi Évole, Salvados é o nome de seu programa “dominical”, no horário do nosso “querido” Fantástico.
Jordi é um Marcelo Tás mas com uma trajetória completamente invertida, de bufão a jornalista mais respeitado da televisão de seu país.
Consegue fazer as perguntas mais duras e incisivas sem perder a compostura e “la ternura jamás”.
Esses programas deveriam ser obrigatório em nossas escolas de jornalismo.
Quando vejo seus programas e os comparo com os nossos jornalismo me dá vontade de gritar de raiva. Como podemos suportar tanta burrice, mediocridade e mal caratismo por tantos anos! Nós que tivemos programas com o Abertura !!!

Responder

    Policarpo em 22/09/2017 - 23h07 comentou:

    perdão: Julio Anguita foi dirigente do Partido Comunista Espanhol e não do PSOE.

Policarpo em 25/09/2017 - 22h55 comentou:

http://www.eldiario.es/carnecruda/
CC 335 – Anna Gabriel “Si gana el si declararemos la independencia” (PROGRAMA COMPLETO)
podcast

…que falta nos faz um Jordi, um Javier Gallego, um Jesus Cintora, uma Sexta, um Publico, um Eldiario , um mínimo de pluralismo…

Responder

Deixe uma resposta

 


Mais publicações

Cultura

Quem matou o diplomata brasileiro? Um mistério no Itamaraty da ditadura


Paulo Dionísio de Vasconcelos saiu de casa após o almoço e apareceu morto, num carro, na Holanda, em 1970. 40 anos depois, jornalista revela sua existência

Politik

STJ dá lição de liberdade de expressão à Folha e libera paródia Falha de…


Os irmãos Lino e Mario Ito Bocchini estão de alma lavada. Há 7 anos travam na Justiça uma luta de Davi contra Golias com a Folha de S.Paulo, um dos maiores grupos de comunicação do…