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Piada pronta: Philip Morris lança fundação “por um mundo livre de fumaça”

Fabricante do Marlboro pretende "acelerar o fim do hábito de fumar cigarros", que seriam substituídos por vaporizadores eletrônicos –também produzidos e comercializados por ela

Anúncio da Philip Morris com Lucille Ball e Desi Arnaz em 1952
Cynara Menezes
02 de outubro de 2017, 17h09

É como se a indústria de armamentos anunciasse a criação de uma fundação “por um mundo livre de guerras”. A Philip Morris, uma das maiores fabricantes de cigarro do planeta, está lançando uma fundação “por um mundo livre de fumaça”. No último dia 13 de setembro, a fabricante do Marlboro anunciou que destinará 80 milhões de dólares nos próximos 12 anos à Foundation for a Free-Smoke World, que teria a pretensão de acelerar o fim do hábito de fumar cigarros no planeta.

Para dar aquele ar de “neutralidade” e seriedade à empreitada, a empresa contratou um ex-diretor da OMS (Organização Mundial de Saúde) para ser o presidente da fundação. O especialista em saúde pública sul-africano Derek Yach explicou ao jornal britânico The Guardian que a ideia por trás de “livrar o mundo de fumaça” é substituir os cigarros de tabaco pelos vaporizadores (Iqos), que, por aquecer o tabaco em vez de queimá-lo, seriam menos danosos à saúde –e que também, é claro, são produzidos e comercializados pela empresa. “A intenção é criar uma fundação independente que reúna os mais altos padrões de normas éticas e legais e que aborde a verificação científica de maneira inovadora”, disse.

A OMS soltou um comunicado dizendo que não se envolverá na fundação e aconselha os governos a também não apoiá-la

Entidades que combatem a indústria do tabaco mostraram ceticismo. Ainda mais a OMS, que viu seu nome sendo de certa forma utilizado para avalizar a fundação, e decidiu emitir um comunicado em que afirma não ter nada a ver com a iniciativa. “A Assembleia Geral da ONU reconheceu um conflito de interesses fundamental entre a indústria do tabaco e a saúde pública. A OMS não se envolve com a indústria do tabaco ou com atores não estatais que trabalham para promover seus interesses. Por isso, o organismo internacional não se envolverá com esta nova fundação”, afirmou a agência da ONU.

Segundo a organização, o artigo 5.3 da Convenção-Quadro da OMS para o Controle do Tabaco (CQCT) indica claramente que os governos devem limitar as interações com a indústria do tabaco e evitar parcerias. Essas diretrizes também explicitam que os governos não devem aceitar contribuições financeiras do setor de tabaco ou daqueles que trabalham para promover seus interesses, como esta fundação, alertou a OMS.

A entidade acusou a gigante dos cigarros de se opor às políticas da ONU de combate ao tabagismo. “Se a Philip Morris estivesse verdadeiramente comprometida com um mundo livre de tabagismo, a empresa apoiaria essas políticas. Em vez disso, opõe-se a elas. A empresa faz pressão em grande escala e litígios prolongados e dispendiosos contra políticas de controle de tabaco baseadas em evidências, como as encontradas na Convenção-Quadro e no MPOWER da OMS, que auxilia na implementação da CQCT”, salientou.

As políticas comprovadamente eficazes para o combate ao tabagismo ainda são os impostos sobre os produtos, os rótulos de advertência gráficos, as proibições abrangentes de publicidade, a promoção e o patrocínio, além de oferta de ajuda para parar de fumar. “Essas políticas não se concentram apenas em ajudar os usuários a largarem o fumo, mas também a prevenir o início do consumo”, completou a agência da ONU, destacando que as pesquisas para redução de danos causados pelo tabaco não devem ser financiadas por empresas que vendem esses produtos.

Se a Philip Morris estivesse verdadeiramente comprometida com um mundo livre de tabagismo, apoiaria as políticas da ONU. Em vez disso, opõe-se a elas

“Apenas no ano passado, por exemplo, a Philip Morris perdeu um acordo de investimento de seis anos com o Uruguai. A empresa gastou aproximadamente 24 milhões de dólares para se opor às advertências de saúde em larga escala e também à proibição de embalagens enganosas em um país com menos de quatro milhões de habitantes”, afirmou a OMS.

“A indústria do tabaco e seus grupos têm enganado o público sobre os riscos associados a outros produtos derivados do tabaco. Isso inclui a promoção dos chamados produtos de tabaco ‘light’ e ‘suaves’ como alternativa a largar de fumar, sabendo que esses produtos não eram menos nocivos para a saúde. Essa conduta enganosa ainda continua nas empresas, incluindo a Philip Morris, que comercializam produtos dessa natureza sugerindo equivocadamente que alguns deles são menos prejudiciais do que outros.”

“Quando se trata da Foundation for a Smoke-Free World, há uma série de conflitos de interesses claros envolvidos com uma empresa de tabaco que financia uma suposta fundação de saúde, ao mesmo tempo que promove a venda de tabaco e também de outros produtos encontrados em seu portfólio. A OMS não se associará à fundação. Os governos não devem fazer parceria com essa iniciativa e a comunidade de saúde pública deve seguir essas orientações”, concluiu.

O “cigarro que não queima tabaco” da Philip Morris

Em 2016, o CEO da Philip Morris, André Calantzopoulos, disse à BBC que a empresa gostaria de atuar junto a governos para promover o fim dos “cigarros convencionais”, isto é, substitui-los pelos Iqos, que continuariam dando lucros bilionários à empresa sem (provavelmente) tantas ações na Justiça. O vaporizador do fabricante do Marlboro, que funciona a bateria, produz nicotina, mas não efetua a combustão do tabaco. A empresa sustenta que o vapor produzido alcança temperaturas muito mais baixas do que os cigarros convencionais e por isso seria “mais saudável”.

“Como o tabaco é aquecido e não queimado, os níveis de produtos químicos nocivos são significativamente reduzidos comparados à fumaça do cigarro”, diz a empresa sobre o Iqos. “O que há nele? Um vapor contendo nicotina –não fumaça– que faz do Iqos um produto livre de fumaça que satisfaz fumantes.” Não há, porém, estudos científicos que apoiem estas conclusões.

 

 

 


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