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Universal escolheu Portugal porque bispos queriam crianças brancas, afirma TV

Série da emissora TVI revelou ainda que os meninos e meninas portugueses adotados pelos bispos da IURD se tornaram jovens problemáticos

Crianças no lar da Universal em Lisboa. Foto: reprodução TVI
Cynara Menezes
23 de dezembro de 2017, 21h11

A série da emissora portuguesa TVI O Segredo dos Deuses, que denunciou a Igreja Universal por tráfico internacional de crianças, chegou ao fim nesta sexta-feira ignorada pela mídia comercial brasileira. Nos últimos episódios e nas reportagens adicionais feitas para o telejornal da emissora, as jornalistas Alexandra Borges e Judite França revelam qual seria a razão pela qual a igreja escolheu meninas e meninos portugueses para adotar: porque os bispos queriam crianças brancas, de preferência loiras e de olhos azuis.

As crianças loiras e de olhos azuis “eram as primeiras a entrar e as primeiras a sair. Eram as mais cobiçadas e eram para os bispos. Os pastores regionais tinham que escolher depois os negrinhos”

“Era difícil a adoção no Brasil de crianças de raça branca, no Brasil eram mais negros e eles não gostavam de negros”, afirma uma ex-funcionária da instituição. De acordo com ela, as crianças loiras e de olhos azuis “estavam na primeira linha de adoção. Eram as primeiras a entrar e as primeiras a sair. Eram as mais cobiçadas e eram para os bispos. Os pastores regionais tinham que escolher depois os negrinhos.”

Entre as principais revelações da série de dez reportagens está a adoção irregular de crianças portuguesas pelas próprias filhas do bispo Edir Macedo, líder da IURD e dono da TV Record, e o destino dos pequenos: se enquanto crianças serviam à igreja como “pequenos pastores” no altar, depois de adultos são usados para angariar fiéis contando a vida errante que tiveram como exemplo de “superação”. Crescidas, as crianças portuguesas adotadas pelos bispos se tornaram jovens problemáticos.

Até agora, dois dos meninos tirados do Lar Universal, entidade mantida pela IURD em Lisboa durante os anos 1990, tiveram problemas com drogas. Um deles, Fábio, irmão dos filhos adotivos de Viviane Freitas, filha de Edir, morreu de overdose aos 19 anos. O outro, Felipe, filho de Cristiane Cardoso, a primogênita do bispo, também se envolveu com cocaína, como ele mesmo contou em entrevista ao avô. Na sexta-feira a série mostrou que Raquel, filha adotiva do bispo João Luis Urbaneja, tentou o suicídio mais de uma vez, como conta neste vídeo de 2014.

Raquel não é identificada na reportagem, porém é fácil perceber de quem se trata pelo vídeo borrado veiculado; a imprensa portuguesa também deixou claro se tratar da filha de Urbaneja. A história da adoção dela é espantosa: a menina foi retirada da maternidade com apenas dois meses de vida para ser adotada por Urbaneja e sua mulher. Nos papéis ela aparece como filha legítima do bispo, mas a adoção foi feita de forma inteiramente ilegal, já que os registros de nascimento foram borrados da maternidade.

No último episódio da série, seu possível pai biológico, um taxista de Lisboa, reclama nunca ter sido consultado pela mãe ou pela Justiça sobre a adoção e se oferece para um exame de DNA. A mãe da menina, que já tinha dois filhos, teria dado Raquel para os membros da IURD num momento de desespero. Ela não foi localizada pela reportagem.

Ser filho da Igreja Universal, ser filho de um bispo e de um pastor, você vê muita coisa. Você vê muita coisa que não faz bem. Você vê seu pai, sua mãe, no altar, pregando uma coisa, e quando a reunião acaba é que você vê quem ele é

Um jovem adotado irregularmente por um bispo da Universal em Portugal, Lucas Paulo, uma das fontes da série de dez reportagens, dá sua explicação para o fato de as crianças não terem se adaptado às novas famílias. “Ser filho da Igreja Universal, ser filho de um bispo e de um pastor, você vê muita coisa. Você vê muita coisa que não faz bem. Você vê seu pai, sua mãe, no altar, pregando uma coisa, falando uma coisa, dizendo que é para o bem das pessoas, e quando você vai para trás do altar, quando a reunião acaba é que você vê quem que ele é”, diz o rapaz, que abandonou a família postiça e a igreja.

 

No penúltimo episódio, uma avó reclama que suas netas gêmeas foram “roubadas” pela Igreja Universal e adotadas pela advogada do lar, com quem estão até hoje, aos 20 anos de idade. A avó perdeu todos os processos judiciais movidos para tentar recuperar as crianças. Como o caso já prescreveu, é pouco provável que alguém pague na Justiça pelas adoções irregulares, mas o Ministério Público português abriu investigação para apurar a responsabilidade das autoridades que permitiram a saída de menores para o estrangeiro.

Leia todas as publicações do Socialista Morena sobre o caso aqui. Assista ao nono e o décimo episódio da série abaixo.

 

 


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(3) comentários Escrever comentário

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ronau em 24/12/2017 - 07h05 comentou:

que Dionisio nos salve dessa gente.

Responder

Sergio em 26/12/2017 - 08h42 comentou:

Por que a imprensa não está divulgando esses fatos gravíssimos? O que está acontecendo? Interessaria a Globo bater na emissora rival, como já o fez nos anos 90. Estranho!

Responder

    Viviane em 23/01/2018 - 15h53 comentou:

    No caso da Globo, pode ser retribuição pelo fato de a Record não ter divulgado o caso da sonegação de impostos na compra dos direitos de transmissão da Copa 2002 (caso que teve até uma funcionária da Receita no Rio “dando sumiço” no processo). Na época, os jornalistas Paulo Henrique Amorim e Luiz Carlos Azenha até publicaram sobre em seus blogs pessoais, mas a emissora ficou muda! Quanto às demais emissoras, todas têm o “rabo preso” com as duas maiores. Ou seja, uma mão lava (ou ameaça) a outra.

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