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Feminismo

Estupro e feminicídio são crimes contra a humanidade

Não estamos seguras nem no centro cirúrgico na hora do parto e nem depois de mortas, sobre a mesa do necrotério. Basta!

Imagem da mostra “Presenças Invisíveis”, no Museu da Justiça do Rio. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Rita Andrade
21 de julho de 2022, 12h57

Se você demorar 10 minutos para ler esse texto, uma mulher ou menina terá sido estuprada no Brasil. Se você decidir dormir e deixar o texto para ser lido amanhã, uma mulher terá sido assassinada, vítima de feminicídio. É real essa revoltante cronologia.

A cada 10 minutos uma mulher é vítima de estupro em alguma Unidade da Federação do país e a cada sete horas uma mulher é morta simplesmente por sua condição de mulher, crime que caracteriza o feminicídio. A informação toma por base no período de março de 2020 a dezembro de 2021 e foi divulgada pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública.

Não é nossa roupa, o que dizemos, o que escrevemos ou como andamos na rua que nos mata, mas a cultura do machismo, o desinteresse do Estado, a falta de trajetos seguros e de iluminação pública, o descumprimento da lei e a ausência de uma educação voltada para a cidadania e o respeito

No Distrito Federal, o Fórum registrou 532 casos de estupros de mulher ou menina e 25 de feminicídio no período analisado. Aqui no DF, 80,3% dos estupros ocorrem dentro de casa, espaço que deveria ser de segurança para as mulheres e as crianças, mas que se tornou uma armadilha. Na maioria dos casos, o estuprador é um parente da vítima, amigo ou conhecido da família, raramente é um estranho.

E o número pode ser ainda muitíssimo pior. O Fórum destaca que nos primeiros meses de 2020, por conta da quarentena provocada pela pandemia de Covid-19, o acesso aos órgãos de segurança ficou limitado e as mulheres e as meninas não tiveram como pedir ajuda e denunciar as agressões sofridas. Em muitos casos, elas tiveram de conviver com o agressor dentro de suas casas por muito tempo. Sinistro…

As instituições falharam. O Estado falhou. O desgoverno, mais uma vez, mostrou sua incapacidade para garantir a segurança de mulheres e crianças. Não foram criadas estratégias de proteção e defesa das pessoas vulneráveis, não foi criado um sistema rápido de alerta e nem rondas nas regiões do DF onde os órgãos de segurança já sabem onde há maior ocorrência de crimes desta natureza.

As vítimas contaram apenas com o suporte de suas redes de proteção, como vizinhas e amigas, e com algum apoio das organizações não-governamentais que, por mais que façam, não conseguem assumir uma missão que compete ao Estado. Ninguém vai nos salvar a não ser nós mesmas.

Nós, mulheres, temos de ampliar as redes de proteção existentes e construir novas estratégias. Não é nossa roupa, o que dizemos, o que escrevemos ou como andamos na rua que nos mata. O que nos mata é a cultura do machismo, o desinteresse do Estado, a falta de trajetos seguros na cidade, a falta de iluminação pública, o descumprimento da lei e a falta de uma educação voltada para a cidadania e o respeito, entre outros aspectos. Nós, mulheres, exigimos políticas de proteção e novas estratégias de prevenção desses crimes bárbaros.

Hoje sabemos que não estamos seguras nem no centro cirúrgico na hora do parto e nem depois de mortas sobre a mesa do necrotério. O estupro é uma ferramenta de poder, onde o estuprador submete a vítima e a reduz a objeto disponível para seu prazer bestial, é uma arma. Basta! Vamos implementar políticas públicas que acabem com esses crimes “hediondos” que são o estupro e o feminicídio, que deveriam ser enquadrados dessa forma. Embora a Lei 8.072, de 25 de julho de 1990, estabeleça as condições em que o estupro é um crime hediondo, não vemos, de fato, sua aplicação no Brasil.

É de extrema urgência que se tenham políticas preventivas contra tanta violência contra as mulheres, não podemos continuar sendo violentadas e mortas aos montes. Não podemos permitir que mais mulheres entrem nessas estatísticas de morte.

Basta, tirem as mão dos nossos corpos!

*Rita Andrade é feminista militante do Levante Feminista Contra o Feminicídio, Ativista da cultura, Radialista, Professora de Artes, pós graduada em Desenvolvimento Humano de Gestores pela FGV. Conselheira Nacional de Cultura – CNPC e Presidenta do Conselho de Curadores da FBT (Fundação Brasileira de Teatro)


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