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Cultura

Pedro Juan: “É preciso aceitar que passamos 60 anos tentando fazer todos iguais e não é possível”

Em entrevista exclusiva, escritor cubano comenta a censura que sofreu em Brasília e defende a aceitação das diferenças de classe em seu país

O escritor Pedro Juan Gutierrez durante palestra em Brasília: Foto: Luís Muller/divulgação
Cynara Menezes
16 de junho de 2019, 09h31

No final da manhã da terça-feira 11 de junho, os produtores da exposição O sangue no alguidá, um olhar desde o realismo sujo latino-americano já tinham pintado a principal sala do Museu dos Correios, em Brasília, e os quadros do cubano Pedro Juan Gutiérrez e do goiano Gerson Fogaça, repousavam nas paredes, à espera de serem pendurados, quando foram chamados pela direção do espaço para um ultimato. Ou excluíam cinco dos quadros ou teriam de cancelar a mostra. A palestra com Gutiérrez, marcada para a noite seguinte no auditório, também deveria ser transferida para outro local.

Pedro Juan não pôde conter o riso ao saber que haviam censurado suas colagens por “pornografia”. “Uma coisa ridícula, completamente ridícula. Comecei a rir às gargalhadas quando a produtora me contou. Não imaginava, não esperava isso precisamente no Brasil. Além de tudo, uma censura por questões eróticas, não por razões políticas, e sim pelo erotismo. Me espanta tanto ver isso logo no Brasil. É muito estranho acontecer algo assim num país onde as pessoas têm uma sexualidade, um erotismo, que vivem seu sexo tranquilamente”, comentou.

Os quadros censurados pelos Correios da era Bolsonaro continham pouca coisa digna de espanto: num dos poemas visuais de Gutiérrez, aparecia um piruzinho do lado de fora da bermuda de um turista gringo; em uma pintura de Fogaça, incomodou os censores a foto de João Wainer com Pedro agarrando uma prostituta, tirada de uma matéria que fizemos com o escritor em 2001 para a Folha de S.Paulo; outra colagem do cubano foi vetada porque tinha uma gravura do tempo da vovó… A impressão é que as Senhoras de Santana tomaram conta das instituições culturais do país.

Poema visual de Pedro Juan Gutiérrez

Obra de Gerson Fogaça

Colagem de Pedro Juan

Pintura de Fogaça com foto de João Wainer ao centro

Neste quadro de Fogaça os censores enxergaram todo tipo de pornografia…

Obviamente os organizadores se recusaram a cumprir a exigência, e começou o corre-corre para conseguir abrigar a exposição em outro espaço da capital federal. A palestra acabou acontecendo na Casa da América Latina, onde não havia, porém, salas disponíveis para a mostra. Por sorte, o diretor do Museu Nacional, Charles Cosac, teve a maior boa vontade de receber os trabalhos dos dois artistas, sem nenhum veto, de última hora. E lá está ela, em cartaz até o dia de 6 de agosto.

O escritor Pedro Juan Gutiérrez falou com exclusividade ao site sobre a censura à exposição e, como raras vezes em entrevistas, de política cubana. Se descreveu como “social-democrata”, disse que em Cuba existe “uma espécie de social-democracia” e defendeu que seu país aceite as diferenças sociais como forma de abrir a economia. Ou seja, que aceite a existência de classes, uma blasfêmia aos olhos do comunista cubano clássico, praticamente uma capitulação.

Comecei a rir às gargalhadas quando a produtora me contou da censura. Além de tudo, uma censura por questões eróticas, não por razões políticas. Me espanta tanto ver isso logo no Brasil, um país onde as pessoas têm uma sexualidade, um erotismo, que vivem seu sexo tranquilamente

“Enquanto a economia não se abrir um pouco mais e Cuba aceitar as desigualdades na economia –que vai haver gente rica e gente mais pobre, gente com mais dinheiro e gente com menos dinheiro–, se não aceitar esse princípio, vai continuar com problemas. Temos uma economia demasiadamente controlada pelo governo sem que isso dê bons resultados. É preciso aceitar que passamos 60 anos tentando fazer todos iguais e não é possível”, defende.

Ao mesmo tempo que tem seus reparos, o escritor reconhece as conquistas do governo e, apesar dos problemas atuais e de enxergar em Trump uma “obsessão estúpida” por sufocar Cuba, acha que o país vai avançando, “pouco a pouco”: 21 anos depois, finalmente foi publicada em seu país natal a obra que consagrou Pedro Juan, Trilogia Suja de Havana, ainda assim com distribuição restrita.

Há 18 anos que conheço o escritor; já o entrevistei quatro vezes. E a parte que mais me impressionou foi sua mudança espiritual. Senti na palestra que estava mais calmo, contido, e na entrevista ele confirmou que se encontrou no budismo após uma noite de borracheira que descambou para as vias de fato entre ele e o fotógrafo que fazia as imagens para o livro Sol Mestizo. O cubano dionisíaco virou budista, quem diria. Não é à toa o aspecto de monge tropical.

Leia abaixo a íntegra da conversa.

Socialista Morena – Pedro, é a primeira vez que você expõe seus poemas visuais no Brasil. Como  foi saber sobre a censura à exposição?
Pedro Juan Gutiérrez – Não imaginava, não esperava isso precisamente no Brasil. Além de tudo, uma censura por questões eróticas, não por razões políticas e sim pelo erotismo. Me espanta tanto ver isso logo no Brasil. É muito estranho acontecer algo assim num país onde as pessoas têm uma sexualidade, um erotismo, que vivem seu sexo tranquilamente.

O pior é que não havia nada demais nos quadros…
Uma coisa ridícula, completamente ridícula. Eu comecei a rir às gargalhadas quando a produtora, Malu da Cunha, me disse que o Museu dos Correios tinha censurado. Mas isso também acontecia comigo em Cuba. Há três anos, fiz uma exposição em uma galeria em Havana Vieja e aconteceu o mesmo. De uns 40 poemas visuais que se exibiram lá, 14 foram censurados por questões eróticas. Tive que retirar os 14 poemas e substituí-los. De algum modo estou acostumado com a censura, em 26 anos como jornalista sofri muita censura em Cuba.

Ainda há censura lá?
Sim. Há muitos assuntos dos quais não se pode tratar, há muitos assuntos dos quais só se pode tratar parcialmente… Quem paga, manda, não? Então estou acostumado à censura, acostumado a sofrer a censura. Aconteceu comigo algo curioso agora. Pouco a pouco, foram publicando meus livros em Cuba. Quando Trilogia Suja de Havana saiu, em 1998, me demitiram, passei uns anos muito amargos, muito tristes, muito fodidos, porque havia uma incompreensão absurda, estúpida, a partir da publicação do livro na Espanha e em vários países. Mas com os anos isso passou, relaxaram um pouco e começaram a publicar meus livros. Quase todos foram publicados, falta um ou dois sem publicar. E eu pensava que já havia um relax com minha obra, que estava sendo bem difundida, me convidam para umas palestras aqui e ali…

Trump está fazendo uma política agressiva contra a Venezuela e contra Cuba. Contra a Venezuela fica claro por quê: possui a maior reserva de petróleo do mundo. Não importa a Trump que seja Maduro ou verde, Maduro é um pretexto para se apropriar do petróleo. Mas no caso de Cuba é como uma obsessão estúpida

A partir de Raúl Castro ou ainda estava Fidel?
A partir de Raúl, uns sete, oito anos atrás. E afinal, 21 anos depois, conseguimos publicar a Trilogia Suja de Havana. Há agora uma edição cubana, que saiu em fevereiro, da Trilogia. Mas logo se arma uma confusão e as autoridades de cima, vamos dizer assim, mandam que o livro não seja lançado e não seja distribuído. A edição já estava pronta, 3 mil exemplares só, mas ficou muito bonita. Um amigo meu teve que falar com o ministro da Cultura para autorizar e no final o livro acabou sendo distribuído, mas não em todas as livrarias, só nas da União de Escritores e Artistas de Cuba, cuja editora o publicou. Então a Trilogia não está nas livrarias normais, como os outros livros, só nessa, especializada. Também é uma maneira de controlar, de censurar. É como dizer ‘sim, mas não’.

Você sabia, antes de chegar, que o Brasil estava nessa situação, que temos um presidente de extrema-direita?
Sim, em Cuba se fez muito barulho em torno do tema dos médicos que mandaram para lá de volta. Há bastante informação sobre Bolsonaro. Os médicos cubanos realmente resolviam aqui a situação?

É que muitos deles foram trabalhar em locais pobres e longínquos, onde os médicos brasileiros se recusam a trabalhar. Nos distritos indígenas, por exemplo. Agora há crianças indígenas morrendo porque não há médicos. 
Creio que era um trabalho bonito. Bonito, não, necessário. E um trabalho humano, solidário, não? Uma pena.

Como está Cuba? A BBC fez recentemente uma reportagem dizendo que a situação está ruim, que há filas para comprar frango… É verdade isso?
Sim. Estão fazendo filas enormes para comprar frango, óleo, detergente… Uma hora acaba isso, outra hora acaba aquilo, depois volta a ter azeite, depois volta a não ter… Trump está fazendo uma política muito agressiva e muito repentina contra Cuba, muito forte e em pouco tempo. Agora mesmo acaba de decidir que os cruzeiros não entram mais no porto de Havana nem em nenhum porto de Cuba. Isto deixou uma quantidade enorme de pessoas desempregadas. É uma política agressiva contra a Venezuela e contra Cuba. Contra a Venezuela fica claro por quê, a Venezuela possui a maior reserva de petróleo do mundo. Não importa a Trump que seja Maduro ou verde, Maduro é um pretexto para se apropriar do petróleo. Mas no caso de Cuba é como uma obsessão estúpida. Cuba é um país agrícola e turístico, é um país pobre, que não tem recursos naturais importantes e que as pessoas têm que trabalhar na agricultura ou no turismo, não há outra coisa. E este cabrón estúpido, arrogante, paranoico… Creio que tem graves problemas matrimoniais e familiares, então se vinga do resto do mundo. O que está fazendo é aplicar o terceiro parágrafo da lei Helms Burton, que prevê sancionar a terceiros países por negociar com Cuba. Pode sancionar bancos espanhóis, bancos ingleses, bancos canadenses, bancos mexicanos por negociar com Cuba, para sufocar Cuba. Estes terceiros protestam, mas no final têm que ficar calados, porque os EUA podem sancioná-los. Então é uma situação horrível para os cubanos. Tem que acontecer algo, porque não é justo que estejamos vivendo isso. Nós, cubanos, temos o direito de viver como queremos. Se precisarmos fazer uma greve contra o governo, que façamos. Mas dentro do país, como os brasileiros, como todos. Sem intervenção de fora.

Não dizem abertamente, já que a social-democracia está muito desvalorizada, sobretudo na Europa, mas acho que há uma espécie de social-democracia em Cuba, de não deixar ninguém abandonado, o que é muito valioso. É preciso reconhecer isso do governo

É muito difícil para um país ir em frente se não pode ter relações com outros países.
Claro. Por isso há essas carências, este desabastecimento. Agora mesmo meu laptop quebrou e vou ter que comprar um aqui no Brasil. No momento não há laptops em Cuba. 

Sabe o que me incomoda em parte da esquerda? Dizer que dá na mesma quem governe os EUA, que Obama e Trump eram a mesma coisa…
Não, de forma alguma. Obama agiu não como um santo, porque é um político, e os políticos se baseiam na violência, não são santos. Mas Obama agiu de uma maneira muito mais inteligente. Restabeleceu as relações diplomáticas, as relações comerciais… Era uma figura muito mais humana e muito mais inteligente, porque pensou: ‘Bom, essa política de agressividade não deu resultado ao longo de 50 anos. Vamos mudar a política e fazer intercâmbios culturais, científicos, esportivos, comerciais, e vamos suavizando a coisa para que eles vejam as bondades do capitalismo, não?’ Então tomara que volte um presidente como Obama ao governo dos EUA, seria maravilhoso para Cuba.

Gerson Fogaça e Gutiérrez na exposição. Foto: Valdemy Teixeira/divulgação

Há outra coisa, Pedro, que me perturba como pessoa de esquerda: a União Soviética cai e Cuba cai; a Venezuela cai e Cuba cai. Cuba tem que estar sempre dependente de uma nação amiga?
Cuba não tem petróleo. O principal problema é o petróleo. Sempre se está pesquisando se há petróleo ao redor de Cuba, porque dentro definitivamente não há. Mas a dois quilômetros da costa, pode haver. Só que levam 30 anos pesquisando e não aparece petróleo… Houve companhias soviéticas que pesquisaram, canadenses, mexicanas, nesse momento não sei de quê país, e não aparece petróleo. E é dependente sempre de alguém, de Venezuela, da Rússia, da China, ou de quem seja.

Não entendo por que Cuba nunca explorou o etanol, já que cana-de-açúcar, sim, tem.
Agora estão pesquisando com seriedade tudo isso das energias alternativas, painéis solares… Mas é um país pobre, com problemas na economia. Enquanto a economia não se abrir um pouco mais, essa é minha opinião pessoal, e Cuba aceitar desigualdades na economia, que vai haver gente rica e gente mais pobre, gente com mais dinheiro e gente com menos dinheiro, se não aceitar esse princípio, vai continuar com problemas. Temos uma economia demasiadamente controlada pelo governo sem que isso dê bons resultados.

Eu penso que há um equívoco primordial, que é pensar que um país inteiro possa ser socialista. Porque não é humanamente possível que não haja divergências.
E as divergências são interessantes, por isso se diz ‘viver na diversidade’, aprender a viver na diversidade, inclusive neste sentido econômico. É preciso aceitar que passamos 60 anos tentando fazer todos iguais e não é possível. Em Cuba há muitas coisas boas que o governo está cuidando de salvar, a educação, a saúde, amparar a velhice (temos uma expectativa de vida muito longa, de 78 anos), acesso à moradia… Por exemplo: agora passou por Cuba um furacão e umas 700 casas ficaram destruídas. Pois fabricaram novas casas muito rápido e muito melhores que as anteriores. Não dizem abertamente, mas vejo como um projeto de social-democracia, já que a social-democracia está muito desvalorizada, sobretudo na Europa. Mas acho que há uma espécie de social-democracia em Cuba, de não deixar ninguém abandonado, o que é muito valioso. Acho que é preciso reconhecer isso do governo.

Durante muitos anos tive medo de falar de política, das represálias. Além disso, não queria que minha vida se convertesse em falar de política. Eu estava cheio da política, depois de 26 anos trabalhando como jornalista... E não tinha esperança que o governo melhorasse em Cuba. Agora, sim, tenho essa esperança

Há países que são potência em armas, em petróleo. Cuba é uma potência em educação, saúde, literatura, música… Não está mal, hein? Em comparação com os outros países da América Central e do Caribe, o Haiti, por exemplo. Cuba poderia ser um Haiti, não é verdade?
Sim, totalmente. Culturalmente, ainda mantemos um certo nível, um certo padrão, acima inclusive da Venezuela, da República Dominicana, de Porto Rico… E há uma geração jovem que vem impulsionando, enquanto a minha geração já está como na expectativa do que vai acontecer, politicamente. Mas há uma geração jovem que está agindo com muita força e eu creio que sim, que vai seguir mudando. Cuba dentro de cinco, seis anos, não vai ser a mesma de hoje em dia. Tenho essa esperança.

Vai ficar melhor?
Acho que sim, apesar de tudo vamos melhorando. Esta situação com Trump é circunstancial, conjuntural.

Como vai tua vida literária? Escrevendo ainda ou cansado de escrever?
Faz uma semana que foi publicado meu último romance por Anagrama, se chama Estoico y Frugal. Saiu agora e já está sendo oferecida a meus editores na Grécia, aqui no Brasil, em vários lugares. É Pedro Juan em Europa no final do ano de 1998, acaba de publicar a Trilogia Suja –que não se menciona, se fala “o livro”–, Pedro Juan em Madri, passando muito frio, em Alemanha e depois em Roma, na Itália. Na realidade foi em Viena, na Áustria… É uma espécie de livro de memórias, mas ao mesmo tempo é um romance. E a ideia fundamental é: o que acontece que não me entendem? Regresso a Cuba ou não? Tenho medo de voltar a Cuba ou regressarei? Não é um romance grande, tem umas 180 páginas. E é essa dúvida que se coloca: serei valente para regressar? Por que escrevi este livro tão forte, para quê?

Você já teve mais medo de falar de política, não?
Sim, durante muitos anos tive medo de falar de política, das represálias. Não só medo –bem, foram um pouco duros comigo, me demitiram do trabalho e eu tinha que tomar cuidado–, mas, além disso, eu não queria que minha vida se convertesse em falar de política. Eu estava cheio da política, depois de 26 anos trabalhando como jornalista… E não tinha esperança que o governo melhorasse em Cuba. Agora, sim, tenho essa esperança. E de fato está. Vão abrindo novos direitos humanos, novas possibilidades, melhorou a imigração, uma série de coisas… Mas sigo insistindo que não me interessa estar sempre falando de política. Se você é cubano já tem que falar de política obrigatoriamente. (Risos) Prefiro falar de literatura, de cultura…

Este ano você completa 69 anos, ano erótico… (Risos) Como está teu interesse pelas mulheres, o sexo, sempre presentes em tua vida e obra? Agora parece que você está mais tranquilo.
Sim, estou. Com os anos a pessoa vai se tranquilizando. Tenho minha mulher em Havana, uma filha de 18 anos, a caçula, que agora em setembro entra na universidade. E estou muito mais calmo, muito mais tranquilo. Faz alguns anos que cheguei a uma espécie de limite e comecei a me tranquilizar, a beber menos, zero tabaco, menos luxúria promíscua, estar mais tranquilo. E ao mesmo tempo comecei a praticar o budismo.

Sou uma espécie de Zen de esquerda total, progressista. Não sei se socialista, mas sou muito social-democrata. Estou convencido há muitos anos que é a posição ideal. Nesse momento o melhor para a humanidade seria uma social-democracia clássica

Percebi em sua palestra que você estava diferente… Mais zen.
Sim, menos furioso. Com menos ira. Antes de você chegar estava fazendo minhas orações. É um budismo que se chama Nitiren Daishonin, um ramo do budismo japonês, e se baseia num mantra, numa mandala que ponho diante de mim e repito um mantra: Nam Myōhō Renge Kyō, Nam Myōhō Renge Kyō, Nam Myōhō Renge Kyō… Repito algumas vezes enquanto faço minhas orações. Levo já 12 anos praticando, desde 2007. E isso me ajuda muito, porque fui, interiormente, me equilibrando comigo mesmo. Vai diminuindo a ansiedade e creio que o ego também. Você começa a ver a vida de um ponto de vista mais espiritual. Percebe que tudo isso de fama e fortuna é uma ilusão, que o que vale realmente é teu interior, como você está interiormente. E vai te preparando para a vida eterna, creio que há reencarnação realmente. Quando você começa a compreender que há vida infinita, sem princípio nem fim, sua vida no planeta muda por completo, você vê tudo com mais tranquilidade, com mais sossego, como uma obra de teatro que está funcionando a teu redor. E em realidade tua espiritualidade está muito protegida.

Como o álcool faz mal às pessoas, não?
Muito. A mim o álcool faz muito mal, tanto à saúde quanto à relação com as pessoas. Eu ficava muito agressivo, porque uma vez que tomava um trago, tinha que seguir bebendo. E chega um momento que destrói sua saúde e sua relação com os outros, porque você fica muito agressivo. Prejudica as relações com teus amigos, com tua família.

Você mistura o budismo com a santería (o candomblé cubano)?
Não sou da santería, minha mulher, sim. Eu passei pela vida por distintas etapas espirituais. De pequeno era muito católico, igual à minha mãe. Meu pai, não, sempre foi ateu. Fui católico até os 13 anos, quando, em uma procissão, tive que ajoelhar para beijar a mão de um padre. Me senti tão humilhado, tão ofendido e tão incomodado que larguei. Além disso, já tinha problemas ideológicos com o catecismo, não acreditava na Santíssima Trindade, não acreditava em Adão e Eva no Paraíso… Então com 13 anos rompi com a filosofia cristã e comecei a ler livros marxistas, de Lenin, estive nisso até os 40 e poucos. E aos 41, 42, comecei a recuperar minha vida espiritual, mas através da santería. Experimentei isso uns anos, não me convencia muito, mas experimentei, até descobrir o budismo. Com o budismo me sinto muito bem. O budismo e a escrita. E não necessito álcool. Tomo uma cerveja, uma dose de rum, uma caipirinha… Mas uma caipirinha, não? Não duas nem três nem quatro…

Sabia que o título do livro do site é Zen Socialismo? Você acha que agora é um socialista zen?
Me parece que sim, que sou uma espécie de Zen de esquerda total, progressista. Não sei se socialista, mas sou muito social-democrata. Estou convencido há muitos anos que é a posição ideal, há um equilíbrio na social-democracia teórica utópica, que conheci diretamente na Suécia em 1999. Nesse momento o melhor para a humanidade seria uma social-democracia clássica.

***
O quê? Exposição O sangue no alguidá, um olhar desde o realismo sujo latino-americano. Obras de Pedro Juan Gutiérrez e Gerson Fogaça.
Onde: no Museu Nacional da República. Até 6 de agosto, de terça a domingo, das 9h às 18h30. Entrada franca.


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