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Histórias Cruzadas: as domésticas nos EUA

Quando o filme Histórias Cruzadas estreou nos Estados Unidos, em 2011, sofreu muitas críticas de entidades afro-americanas por mostrar a vida das empregadas domésticas do Mississipi sob uma ótica “branca”. Isso porque é uma “patroazinha”, em plena década de 1960, quem conta a história das mulheres negras que limpavam as casas, cozinhavam e criavam os […]

Cynara Menezes
24 de março de 2013, 19h16

Quando o filme Histórias Cruzadas estreou nos Estados Unidos, em 2011, sofreu muitas críticas de entidades afro-americanas por mostrar a vida das empregadas domésticas do Mississipi sob uma ótica “branca”. Isso porque é uma “patroazinha”, em plena década de 1960, quem conta a história das mulheres negras que limpavam as casas, cozinhavam e criavam os pequenos bebês brancos dos americanos. É quase como aqui, sendo que no Brasil é ainda pior: nos EUA, as empregadas voltavam para suas casas depois do trabalho, não dormiam no emprego; tinham suas próprias famílias. Outro aspecto diferente é que quando os patrões resolvem construir “banheiros de empregada”, se arma um escândalo. Aqui é normal, ninguém nem liga mais.

Pode ser que fosse mais politizado se a história fosse narrada por elas mesmas, mas eu acho legítimo que as meninas criadas pelas negras também tenham direito à sua visão sobre a história. Me identifiquei com a narradora do filme e creio que muita gente no Brasil sentiu o mesmo. Na casa dos meus pais raramente tivemos empregada. Mas chorei a película inteira ao lembrar de uma empregada da família: Raquel. Raquel trabalhou na casa da minha avó paterna e, quando minha tia caçula casou, foi morar com ela. Viveu a vida inteira lá, nunca teve filhos, marido. Era adorada pelos meus primos, “parte da família”, mas nunca deixou de ser uma empregada doméstica. Um dia, minha tia entrou no quarto e encontrou Raquel morta. Essa foi a sua vida.

Me dói o coração pensar que isso existiu e ainda existe. Celebro a PEC das empregadas domésticas que está prestes a ser aprovada pelo Congresso. Tem que pagar todos os direitos trabalhistas a elas, sim. Tem que estimulá-las a estudar. Tem que fazer o possível para ajudá-las a progredir na vida, como qualquer trabalhador. Perguntam a mim: e se não houver mais empregadas que queiram trabalhar ganhando pouco? Melhor que acabem, é ótimo. Essa situação esdrúxula não existe nos países mais civilizados do mundo. Se você quer empregada, pague bem a sua. Se não puder pagar, faça a limpeza da sua casa você mesmo.

Assistam o filme, vale a pena. Só encontrei dublado, infelizmente.

http://youtu.be/yC2_a8lxGPQ


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Neto em 25/03/2013 - 13h53 comentou:

Oi, Cynara
Leia o post publicado no blogdacidadania sobre este tema. Eduardo Guimaraes, que assina o blog, publicou e comentou um artigo de Danuza Leao, na Folha de Sao Paulo, a respeito do assunto. Prepare-se, Danuza consegue ser pior a cada dia.

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mdasilvadeoliveira em 26/03/2013 - 19h59 comentou:

Ola Cynara, gostei de ler o artigo sobre domesticas. Muito interessante. Tambem sou socialista e amo fazer pães. 🙂

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Marcelo Aguiar em 26/03/2013 - 22h50 comentou:

Nem todas as histórias são iguais. Não é incomum na história daqui do Sul que moças do interior viessem a ser empregadas domésticas na "cidade grande" (na maioria descendentes de alemãs) para quebrar a lógica da colônia. Aqui moravam com a família, tinham hora para trabalhar, iam à escola, finais de semana livres, namoravam. Na família de minha esposa a ex-empregada da vó dela é formada, já foi primeira-dama do seu município de origem. Tem o maior amor pela família que a contratou. Só narro isso para mostrar que existem histórias diferentes, que obviamente não objetam a PEC. Há muitos anos atrás uma política negra veio proferir uma palestra sobre a empregada doméstica e o racismo. As possoas estranharam um pouco o assunto, porque o que ela narrava ninguém conhecia. O Brasil é diferente. Minha faxineira é russa, bem loirinha de olhos azuis. Só contei por curiosidade. Viva a PEC!

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noctívago em 29/03/2013 - 01h00 comentou:

O que me encantou no filme foi uma espécie de sub narrativa. Ou um viés de como o filme adquire mais um narrador, que somos nós. Explico. A sensibilidade, nas crianças, brota de quem é a mãe de fato. A empregada narradora. Tanto ė verdade que o último ato dela é partir, sentida e humilhada ( numa percepção da realidade que a atingia: ser subcidadã ), afogar dentro de seu coração o choro daquela criança que ela aprendera a amar como filha. Mas que naquele jogo de carências, reproduzir ou viver aquele amor é permanecer dominada.

E ela rompe.

Qual é a sub narrativa? Ė a brilhante ironia: no meio de tanto racismo, de tornar coisa à pessoas, quem deu a humanidade, quem gerou humanidade dentro da alma daquela criança não tinha sido os pais. E sim ela, a narradora, a empregada, a meio gente.

A mesma coisa funciona com o livro. A personagem de Emma Stone é uma agregadora. Escritora, Mais a obra, surpreendente, são as personagens. Corajosas e rudes. Desiludidas, sobreviventes, onde só há desvalor. Mas são as autoras.

Filmaço.

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vinncent em 29/03/2013 - 07h33 comentou:

"Se você quer empregada, pague bem a sua. Se não puder pagar, faça a limpeza da sua casa você mesmo."

Eu amei. Eu sou da classe média-alta Californiana (EUA) e eu aprendi bem cedo que eu tinha que cuidar do meu espaço. Nenhuma "empregada" entrava na nossa casa – até morar aqui no Brasil a ideia ia parecer ridiculo. Só os riquissimois tinham "help" e na escola, faculdade, etc., as poucas pessoas que tinham nem iam admitir isso para a gente – as pessoas normais. Se tivessem falado, ninguem aceitaria eles. Ninguém na faculdade ia namorar o patético que nem podia limpar seu próprio quarto.

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PAULO ROBERTO MARTINS em 04/12/2020 - 11h08 comentou:

Mas também tinham aqueles casos muito comuns de buscarem jovens na colônia para “criarem”,prometendo mundos e fundos,e depois tornavam as meninas empregadinhas da familia,recebendo casa comida,roupas usadas e … nenhum salário.Afinal,não eram empregadas,mas ‘filhas de criação”.Portanto não vamos endeuzar esta falsa bondade da classe média urbana,que diziam estar “ajudando” as meninas a sairem da vida difícil da colônia,mas queriam mesmo eram serviçais de graça.Conheci casos em que até marido arranjavam para as infelizes. coisa da idade Média!

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