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Nicolelis, cientista do projeto Andar de Novo: “Nosso próximo passo é sobreviver”

A pesquisa do brasileiro com paraplégicos está ameaçada pelo corte de verbas de Bolsonaro nas universidades públicas

Paciente caminha com ajuda da interface cérebro-máquina. Foto: reprodução youtube
Cynara Menezes
28 de maio de 2019, 13h47

O paulistano Miguel Nicolelis, 58 anos, um dos cientistas brasileiros mais reconhecidos no exterior por suas pesquisas no campo da neurociência, pode ter seu trabalho interrompido em breve por conta dos cortes que o governo Bolsonaro está fazendo nas universidades. A última conquista de Nicolelis foi fazer dois paraplégicos caminharem sem a ajuda do exoesqueleto utilizado no chute que abriu a Copa do Mundo, em 2014. O chute projetou a atuação do brasileiro à frente do projeto Walk Again (Andar de Novo), um consórcio internacional de pesquisadores em torno da ideia quase bíblica de fazer paraplégicos voltarem a caminhar.

“Nosso próximo passo é sobreviver. Estamos no mesmo ônibus da crise das universidades federais. A parceria com a Finep acaba agora em junho e tanto este projeto quanto o campus do Cérebro, em Macaíba (RN), que construímos há 16 anos, são agora uma incógnita. No final de 2017, com os cortes feitos por Temer, tivemos que fechar as escolas de educação científica infanto-juvenil, um projeto premiado internacionalmente que previa educação para a toda a vida, desde o pré-natal das mães”, diz o cientista. “Nada nos garante que vamos conseguir sobreviver, apesar dos resultados educacionais, médicos e científicos serem claros. Essa é minha tragédia pessoal neste momento.”

No início de maio, o site Scientific Reports, do mesmo grupo da renomada Nature, publicou um artigo da equipe de Nicolelis com as recentes conquistas obtidas em suas pesquisas com paraplégicos. Dois pacientes com os níveis mais graves de lesão medular “foram capazes de caminhar com segurança, com entre 65% e 70% do peso suportados pelo próprio corpo, acumulando ao todo 4.580 passos”, segundo explicaram os cientistas no estudo. Para Nicolelis, o que mais impressiona é o fato de a interface cérebro-máquina ter trazido melhoras neurológicas em 7 dos 8 voluntários do estudo, a ponto de estes dois andarem autonomamente.

“Este é um achado totalmente inédito. Observamos uma transformação plástica do cérebro, mudanças de volume diárias. Alguns dos pacientes passaram a ter controle da bexiga e do reto e também recuperação das funções sexuais. Uma das mulheres, paraplégica após ser atropelada por um ônibus, começou a sentir sensibilidade perineal, a sentir os períodos menstruais. E agora é mãe”, conta.

Ele publicou o vídeo da caminhada em seu perfil no twitter.

“Quando eu comecei a fazer pesquisas com pacientes com lesão medular, me diziam: ‘nem vai trabalhar com isso porque nunca você vai ver nada de avanço’. E aqui estou eu, 30 anos depois, contrariando todas estas opiniões”, celebra Nicolelis. “São 25 milhões de lesionados medulares no mundo, 65% deles com lesões graves. Ninguém achava que existia uma terapia para isso e agora temos uma potencial terapia.”

O Brasil havia se tornado um player na geopolítica mundial e tivemos que ser decepados. Voltamos para os anos 1940, para a época do Dutra. Antes do Juscelino. É um retrocesso enorme

Ele conta sobre a emoção dos participantes quando ficaram de pé pela primeira vez utilizando o exoesqueleto. “Foi uma experiência inesquecível. Eles relataram a sensação de andar com as próprias pernas, algo similar à ‘ilusão do membro fantasma’ que os amputados têm. Todo mundo que estava participando chorou. Para um cientista, que trata de coisas abstratas, ver aquilo se transformar em algo tangível, que transforma a vida das pessoas, é gratificante”, diz. “Não se trata só de andar, a experiência melhorou a autoestima dos participantes. Havia pessoas com depressão, que não saíam de casa, e conseguiram emprego, passaram a trabalhar.”

O cientista, bastante atuante politicamente nas redes sociais, também comentou o retrocesso que vive o país desde o golpe contra Dilma Rousseff, em 2016. “O Brasil havia se tornado um player na geopolítica mundial e tivemos que ser decepados. Os donos do mundo resolveram passar a guilhotina em nós e só agora as pessoas de fora do país estão se dando conta disso”, lamenta. “Voltamos para os anos 1940, para a época do Dutra. Antes do Juscelino. É um retrocesso enorme.”

 


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