Socialista Morena
Feminismo

“Máscara é coisa de viado”. Ou: a heterossexualidade frágil dos heterossexuais

Pobre do homem cuja masculinidade depende de usar ou não um trapo no meio da cara

A capa da New Yorker com Donald Trump. Foto: reprodução
Cynara Menezes
08 de julho de 2020, 16h38

Como é difícil a certos homens heterossexuais sustentarem a própria heterossexualidade, não? Manter a masculinidade aparenta ser um verdadeiro sacrifício para o hetero, um abnegado que resiste bravamente à tentação de ser homo, a ponto de coisas prosaicas representarem uma ameaça: não pode ter peças cor-de-rosa no vestuário; não pode decorar a casa a não ser de um “jeito hetero”; não pode ser afetuoso com outros caras. Tem homem que nem dança algumas músicas, tipo Wake Me Up Before You Go-Go, do Wham!. Vai que…

Uma característica do hetero frágil é que ele também costuma fazer exigências enormes às mulheres: precisam estar inteiramente depiladas ou eles não sentem tesão; estrias e celulite os fazem broxar; calcinha e sutiã descombinadas, então… É dura, amigos, a tarefa de manter-se hetero neste mundo. Ou flácida, depende do ponto de vista.

A mais nova ameaça à masculinidade são as máscaras contra a Covid-19. Donald Trump se recusa a aparecer em público usando máscaras e retuitou uma postagem do comentarista reaça Brit Hume, da Fox News, tirando sarro do rival do presidente, Joe Biden, por comparecer a um evento de máscara –aliás, bastante estilosa.

Em resposta, Biden tocou no nervo: “Presidentes devem dar o exemplo e não se envolver em tolices e serem falsamente masculinos”. Pois é, como não pensar que toda essa masculinidade é forçada, se fraqueja diante de uma máscara para proteger de uma doença contagiosa? “Máscara é coisa de viado”, como diz Jair Bolsonaro a funcionários diante de visitas, segundo revelou a jornalista Monica Bergamo na Folha de S.Paulo.

No twitter, a antropóloga Débora Diniz também foi no ponto. Bolsonaro, como Trump, não quer usar máscara porque isso “afeta” sua masculinidade, o fragiliza. “As tensões de Bolsonaro com a máscara são como o buraco da fechadura sobre a masculinidade tóxica”, escreveu.

Mais que masculinidade tóxica, é uma masculinidade capenga: “homem que é homem não usa máscara”. E esse pensamento não é exclusivo de Bolsonaro e Trump. Um estudo que ouviu 2549 norte-americanos, divulgado em maio pela Middlesex University de Londres, apontou que os homens estão mais inclinados a não usar máscaras em público do que as mulheres porque acham “embaraçosas, sem charme e transmitem fraqueza”.

Esse tipo de afirmação soa ainda mais absurda quando as estatísticas mostram que os homens morrem mais pelo coronavírus do que as mulheres e quando novas pesquisas científicas defendem que o uso de máscaras é o meio mais eficaz (e ainda por cima barato) de prevenir o contágio aéreo. Um estudo recente da Universidade de San Diego sustenta que usar ou não usar máscara não é a questão, e sim a resposta.

Como não pensar que toda essa masculinidade é forçada, se fraqueja diante de uma máscara para proteger de uma doença contagiosa? Além de tudo, Bolsonaro e Trump prestam um desserviço à sociedade ao sabotar o combate ao coronavírus pelo mau exemplo

“Apenas a iniciativa de cobrir o rosto para bloquear a atomização e a inalação de aerossóis portadores de vírus é responsável por reduzir infecções significativamente na China, Itália e Nova York, indicando que a transmissão aérea do Covid-19 representa a principal rota para a infecção”, disse o professor Mario Molina, Nobel de Química em 1995, um dos responsáveis pelo estudo. Em linguagem simples: como o principal meio de transmissão é aéreo e por gotículas, as máscaras impedem que seus perdigotos atinjam outra pessoa e vice-versa.

Ou seja, não é só falta de cuidado consigo mesmo e com o próximo, é burrice. Pobre do homem cuja masculinidade depende de usar ou não um trapo no meio da cara. Homens públicos como Bolsonaro e Trump prestam, além de tudo, um desserviço à sociedade ao sabotar o combate ao coronavírus pelo mau exemplo e pelas decisões que atingem a população como um todo, não só quem tem problemas com a própria heterossexualidade: o presidente brasileiro vetou a obrigatoriedade do uso de máscaras no comércio, nas escolas e nas igrejas.


Apoie o site

Se você não tem uma conta no PayPal, não há necessidade de se inscrever para assinar, você pode usar apenas qualquer cartão de crédito ou débito

Ou você pode ser um patrocinador com uma única contribuição:

Para quem prefere fazer depósito em conta:

Cynara Moreira Menezes
Caixa Econômica Federal
Agência: 3310
Conta: 000591852026-7
PIX: [email protected]
(4) comentários Escrever comentário

Os comentários aqui postados são de responsabilidade exclusiva de seus autores e não representam a opinião da Socialista Morena. Todos as mensagens são moderadas. Não serão aceitos comentários com ofensas, com links externos ao site, e em letras maiúsculas. Em casos de ofensas pessoais, preconceituosas, ou que incitem o ódio e a violência, denuncie.

Samuka em 09/07/2020 - 00h05 comentou:

A máscara é sexy

Responder

Avel+de+Alencar em 09/07/2020 - 17h52 comentou:

Eu sempre desconfio de caras machos demais, honestos demais, moralistas demais e religiosos demais. Sempre tem caroço no angu.

Responder

José Alves em 11/07/2020 - 12h00 comentou:

A da calcinha que não combina com o sutiã é de mijar de rir (desculpe-me a expressão). O cara que broxa por ver uma calcinha no box, é broxa e ponto! Hilário!

Responder

Marcus em 17/07/2020 - 13h11 comentou:

Eu sempre digo: um cara que precisa afirmar sua masculinidade dizendo ‘sou macho’ a todo momento, não tem auto-confiança.

Responder

Deixe uma resposta

 


Mais publicações

Politik

Quem enlameou as Forças Armadas foram os militares que se uniram ao governo sujo…


Defesa, que nada fez contra a militarização da Saúde, agora ameaça o país por não aceitar investigação de corrupção sobre os seus

Politik

A “geração Zuar e Beber” e a cultura de embebedar a mulher para transar


Ao que tudo indica, o sertanejo que vivia com dor-de-cotovelo foi substituído pelo cara que vai para a balada e enche a cara para "pegar mulher"