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O “palhaço triste” de Elifas Andreato que a gravadora rejeitou e Adoniran amou

Retrato do cantor para o disco dos 70 anos acabou trocado por outro, mais convencional, mas se tornou a perfeita tradução do sambista

Adoniran por Elifas Andreato
Da Redação
29 de março de 2022, 17h06

Em 1980, às vésperas do 70º aniversário de Adoniran Barbosa, o desenhista Elifas Andreato foi procurado pela Odeon para fazer a capa de um disco comemorativo onde o autor de Saudosa Maloca iria gravar duetos ao lado de grandes nomes da MPB, como Elis Regina (Tiro ao Álvaro), Clara Nunes (Iracema) e Gonzaguinha (Despejo na Favela). Elifas desenhou o sambista como o via: engraçado, é verdade, mas trágico ao mesmo tempo. Um palhaço triste. Só que os caras da gravadora acharam que o cantor não iria gostar.

É o próprio artista gráfico quem lembra, em vídeo no seu canal de youtube. “Fiz o desenho e levei como pronta a capa para o diretor artístico da gravadora. Ele viu o retrato que eu fiz de Adoniran e falou: ‘Mas será, Elifas, que ele vai entender isso?’ E eu, preocupado, gostava tanto do Adoniran que não queria correr o risco de fazer algo que ele não gostasse… Voltei para São Paulo e fiz outro retrato dele, arrumadinho, e o primeiro desenho eu dei para o Fernando Faro, que era o produtor do disco”, contou.

O “alemão” da capa do disco

Mas, tempos depois, Elifas recebe um telefonema de Faro dizendo que tinha uma pessoa querendo falar com ele. “Me passou o Adoniran Barbosa no telefone: ‘Ô Elifas, eu sou este palhaço triste e não o alemão que você colocou na capa do disco’. Eu acho que poucas vezes passei tanta vergonha, porque subestimar um artista do tamanho do Adoniran Barbosa… Talvez tenha sido resultado da minha pouca idade e do meu encantamento por ele. Mas o retrato rejeitado se tornou o retrato definitivo de Adoniran, porque ele era isso, um palhaço triste.”

A capa do Livro Negro da Ditadura

Elifas também é o autor de uma capa histórica no campo da política, sobre os anos sombrios que vivíamos no Brasil em 1972: é dele a ilustração da caveira usando quepe para o Livro Negro da Ditadura Militar. Iniciativa da organização política AP (Ação Popular), com origem na esquerda católica, o livro denunciava, em 200 páginas, as atrocidades cometidas pelo regime contra os cidadãos brasileiros e que a imprensa do período acobertava.

Paranaense de Rolândia, Elifas Andreato morreu nesta terça-feira, aos 76 anos, em São Paulo, onde morava, após complicações de um infarto. Além de Adoniran, ele fez mais de 360 capas de LPs para cantores como Clementina de Jesus, Chico Buarque, Gilberto Gil, Paulinho da Viola, Martinho da Vila (só para ele foram mais de 30 capas), Elis Regina e Milton Nascimento. Entre os novos nomes da MPB, o artista, que continuava em atividade, desenhou capas para Criolo (Espiral de Ilusão) e Fabiana Cozza (Canto da Noite na Boca do Vento).

 


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