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Vai ter CPI dos atos antidemocráticos e o governo corre para conter os danos

A única hipótese para uma Comissão Parlamentar de Inquérito sobre o 8 de janeiro não ser instalada é o governo conseguir que assinaturas sejam retiradas

Estátua da Justiça é atacada em 8 de janeiro. Foto: Joedson Alves/Agência Brasil
Cynara Menezes
02 de março de 2023, 18h37

No Congresso, mesmo entre os governistas, já é dado como favas contadas que, a contragosto do presidente Lula, haverá mesmo uma CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar os atos antidemocráticos ocorridos no dia 8 de janeiro. Como a oposição já obteve as assinaturas para uma CPMI (Mista, ou seja, com deputados e senadores), a única possibilidade de não haver uma comissão é se houver a retirada de assinaturas, e que isso faça ocorrer o mesmo com o pedido de CPI (só com senadores).

O pedido da CPMI foi protocolado pelo deputado bolsonarista André Fernandes (PL-CE) e conta com o número mínimo de assinaturas para ser instalada: 189 deputados e 33 senadores. Na avaliação do governo, esta seria mais danosa e incontrolável, porque viraria um palco para os parlamentares mais extremistas e performáticos deitarem e rolarem, com as narrativas mais rocambolescas e apelo nas redes sociais. A “redução de danos” à vista é que, já que a CPI é inevitável, que seja a CPI do Senado, protocolada por Soraya Thronicke (União Brasil-MS).

Relator da CPI da Covid-19, Renan Calheiros já havia advertido a Lula que em relação às CPIs cabe a máxima do futebol: “quem não faz, leva”. A avaliação geral, mesmo dentro do PT, é que o governo dormiu no ponto, não traçou uma estratégia e viu, assim, uma CPMI dominada pela oposição surgir no horizonte

Avalia-se que uma CPI apenas com senadores daria mais vantagens ao governo, porque Lula conta com maior apoio na Casa e os principais cargos ficariam nas mãos de partidos aliados: o bloco liderado pelo MDB e pelo União Brasil e o bloco liderado pelo PT e pelo PSD teriam vantagem. Thronicke, como foi a autora do pedido, certamente ocuparia um cargo importante na mesa, provavelmente a vice-presidência, a exemplo do que ocorreu na CPI da Covid, cujo autor do requerimento, Randolfe Rodrigues, ficou com a vice.

O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), foi instado pelo ministro Gilmar Mendes, do STF, a responder em 10 dias por que ainda não instalou a CPI pedida por Thronicke, que obteve 39 assinaturas, 12 a mais que o mínimo necessário. A senadora recorreu ao Supremo tomando como precedente o que ocorreu com a CPI da Covid: na época, os senadores Jorge Kajuru (PSB-GO) e Alessandro Vieira (PSDB-SE) recorreram ao STF e o ministro Luis Roberto Barroso determinou que a comissão fosse instalada.

De acordo com o regimento da Casa, para instalar uma CPI é preciso, em primeiro lugar, ter um fato determinado –e não há dúvida que os atos antidemocráticos do 8 de janeiro são um fato determinado. Em segundo lugar, obter as assinaturas necessárias, o que também foi cumprido em ambos os pedidos. Relator da CPI da Covid-19, o senador Renan Calheiros (MDB-AL) já havia advertido a Lula e aos governistas que em relação às CPIs cabe a mesma máxima do futebol: “quem não faz, leva”.

“As CPIs têm poder de convocar, levantar sigilos, requisitar documentos e outras diligências com um alcance superlativo e maior aderência. A comissão pode convocar, um por um, os golpistas e exibi-los com o desonroso selo do fascismo”, escreveu Renan em artigo publicado pela Folha de S.Paulo no início de fevereiro defendendo a instalação da CPI. “Uma exposição pedagógica que contribui para intimidar os poucos que ainda se insurgem contra o Estado democrático de Direito. A CPI funcionaria como um Tribunal de Nuremberg profilático, mostrando ao mundo as hienas do fascismo e imunizando a democracia. Não vamos permitir que eles reproduzam a Noite dos Cristais.”

Agora é correr atrás do prejuízo e tentar convencer senadores a retirar assinaturas. Se, ainda assim, as assinaturas forem suficientes, o melhor caminho para o governo será abraçar a CPI do Senado, matando a CPMI com membros da Câmara, com potencial mais explosivo

A avaliação geral, mesmo dentro do PT, é que o governo dormiu no ponto, não traçou uma estratégia e viu, assim, uma CPMI dominada pela oposição surgir no horizonte. Agora é correr atrás do prejuízo e contar com Pacheco ganhando tempo, pedindo a reconfirmação das assinaturas –já que foram dadas na legislatura passada–, para que se obtenham desistências. Muitos dos que firmaram o documento hoje são parte do governo: o União Brasil, por exemplo, tem três ministros e vários dos seus integrantes assinaram o pedido de CPI e podem voltar atrás.

Se, ainda assim, as assinaturas forem suficientes, o melhor caminho para o governo será abraçar a CPI do Senado, matando a CPMI com membros da Câmara, tida como mais imprevisível e com potencial mais explosivo. Seja como for, na próxima semana, após a definição sobre os membros das comissões permanentes, o cenário estará mais claro. Instalada a CPI, uma nova batalha já se vislumbra no horizonte: a guerra de narrativas entre governistas e bolsonaristas nas redes sociais.

Veja mais detalhes no programa Brocou na Internet às 20h30, com Cynara Menezes.

 


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Paulo Roberto Martins em 04/03/2023 - 13h16 comentou:

O PT realmente dormiu no ponto.Não enxergou uma oportunidade para expor os fascistas e seus financiadores através da mídia e das denúncias pela CPI. Eu não vejo porque a esquerda quer fugir da raia. Vamos abraçar a briga e desmascarar os golpistas dentro de seu próprio jogo. Afinal, temos ou não temos provas e dados suficientes? Uma grande chance de arrancar a cabeça da serpente. Agora, tem de estar bem preparado. Com algumas cabeças de vento petistas participando é aí que mora meu medo!

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