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Feminismo

Aos 50, a única regra sobre como se vestir é que não há regras

Sobre a deliciosa liberdade de querer agradar só a si mesma, sem se importar a mínima com o que os outros vão pensar

A modelo Helena Christensen. Foto: reprodução
Cynara Menezes
12 de dezembro de 2019, 19h03

Em abril, a supermodelo dinamarquesa Helena Christensen, que acabou de completar 51 anos, foi criticada pela ex-editora da Vogue britânica, Alexandra Shulman, por aparecer usando um bustiê na festa de sua colega, a também modelo Gigi Hadid. “Desculpa, Helena, mas você é velha demais para usar isso”, sentenciou.

Óbvio que muita gente protestou e a própria modelo lamentou que viesse justamente de uma mulher esse tipo de ataque. “São sempre mulheres que perguntam a idade (em uma entrevista). Homens nunca falam desse assunto, porque os homens não estão nem aí, mas uma editora, uma jornalista ou uma escritora mulher irão mencionar isso. É tão estranho como não nos ajudamos”, disse.

Nunca me senti tão livre quanto agora para me vestir. A despeito destas regras todas, o que está dentro de uma mulher de 50 é justamente o contrário: a sensação de que ela pode fazer (e usar) o que quiser

Desde os 20 eu ouço esse tipo de regras. “Uma mulher depois de certa idade não pode usar minissaia ou roupa curta”. “Mulher depois dos 50 não fica bem com cabelo comprido demais. Cabelo curto deixa a mulher mais nova.” “Mulher com 50 anos não pode usar roupa apertada.” Mulher de 50 não pode, não pode, não pode…

Tenho 52 anos. E nunca me senti tão livre quanto agora para me vestir. A despeito destas regras todas, o que está dentro de uma mulher de 50 é justamente o contrário: a sensação de que ela pode fazer (e usar) o que quiser. Há algo no passar do tempo que faz a gente se importar cada vez menos com o que os outros pensam e cada vez mais em não abrir mão de quem somos. A única regra é que não há regras.

Acho que era isso que se chamava de “rabugice” em relação aos velhos “teimosos”. Teimosos por quê? Por só fazer o que tem vontade? Por não se sentir obrigado? Isso é liberdade. Lembro de, aos 35, ter escrito um artigo em que falava da minha inveja dos velhinhos que não estavam dispostos a fazer mais nenhuma concessão na vida. Nenhumazinha. Acho que vou chegar lá.

Há algo no passar do tempo que faz a gente se importar cada vez menos com o que os outros pensam e cada vez mais em não abrir mão de quem somos. A única regra é que não há regras

Hoje de manhã vi uma senhora no supermercado de uns 65 anos, usando uma camisa de botão amarrada na cintura. Dava para ver um pedaço da barriguinha dela e tudo. E o que é que tem? Não é maravilhoso quando você pega no guarda-roupa algo que quer vestir e sai por aí sem a menor preocupação de agradar alguém a não ser a si mesma?

Eu raramente usei short esportivo antes. Tinha vergonha de sair de short, principalmente por conta do assédio masculino na rua. Agora, que nem tenho mais as pernas de uma “novinha”, eu ando todos os dias pela rua com meu shortinho, sem dar a mínima para o que irão pensar. É gostoso andar de short, as pernas tomam sol e é fresquinho. Por que parar? Alguém tem algum poder para decidir isso ou sou eu que decido?

Gosto de usar meus cabelos compridos, secos ao natural, sem escova. Quem é que inventou que mulher mais velha não pode ter cabelo longo, gente? A mulher também era cobrada a pintar os cabelos “porque rejuvenesce”, enquanto o homem “é charmoso grisalho”, mas hoje muitas assumiram os fios brancos. Pintar ou não pintar os cabelos passou a ser uma decisão da mulher, não uma obrigação para nós. Pequenas escravidões das quais nos libertamos.

Acho que aos 50, com sabedoria, começamos a nos tornar de fato quem a gente é. Daí esse sentimento de liberdade sobre se vestir, sobre como se comportar ou como ser. A única pessoa a quem você precisa prestar contas é a você mesmo

Além do mais, à medida em que a gente vai ficando mais velha, vai tendo mais segurança sobre que tipo de roupas gostamos realmente de usar e quais nos favorecem. Hoje, sei exatamente o que fica bem em mim e o que não fica. Nunca mais comprei coisas que ficam encalhadas no guarda-roupa porque não tem nada a ver comigo. Então, quando a gente fica mais especialista em produzir a nós mesmas com as roupas que mais gostamos, temos que parar de usar algumas peças em função da idade? Não parece nada lógico isso.

Aos 50 pode andar de bicicleta? Pode. Pode jogar futebol? Pode. Pode aprender a tocar atabaque? Pode. Pode sair para dançar? Deve. Pode brincar de pega-pega? Pode. Pode usar fantasia? Pode. Pode ir à praia de biquíni? Claro. Aos 50 (e aos 60, aos 70, aos 80…) a mulher pode fazer tudo que ela quiser, o que não pode é forçar a natureza, forçar a barra de si mesma, fingir ser o que não é. Se for para agradar os outros, então, piorou.

Nietzsche fala sobre “como a gente se torna quem a gente é”. Acho que aos 50, com sabedoria, começamos a nos tornar de fato quem a gente é. Daí esse sentimento delicioso de liberdade sobre se vestir, sobre como se comportar ou como ser. A única pessoa a quem você precisa prestar contas é a você mesmo. Vale em qualquer idade, mas aos 50 é como se isso fosse marcado em seu corpo feito tatuagem, que ninguém pode apagar.

Aliás, pode fazer tatuagem aos 50? É lógico que pode.

 


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(16) comentários Escrever comentário

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Ines caribe em 13/12/2019 - 08h04 comentou:

Concordo totalmente. Tenho 54 e me sinto assim. A última vez que pintei meus cabelos foi pro meu aniversário de 50…depois larguei geral essa escravidão.
Me sinto bem e linda. As vezes penso em pintar para mudar, como fazia antes de começar a pintar somente por causa dos brancos.

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miriam mattos machado em 13/12/2019 - 17h04 comentou:

Realmente, com o passar dos anos, nos sentimos cada vez mais libertas das amarras sociais e midiáticas. Passamos a atender a nós mesmas, aos nossos próprios caprichos. Parabéns pela matéria com essa top mode.

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Fábio P. R. em 13/12/2019 - 19h36 comentou:

“Acho que aos 50, com sabedoria, começamos a nos tornar de fato quem a gente é”

E aos 40, qual foi o tipo de percepção que você teve?

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Rosangela de Oliveira em 14/12/2019 - 17h09 comentou:

Parece que esse artigo foi escrito por mim, amo a minha liberdade, as escolhas que faço e a decisões que tomo, só tem um objetivo a minha felicidade. É isso é a única coisa que importa.

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Dinne Braga em 16/12/2019 - 17h16 comentou:

Que matéria extraordinária!

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Ademir em 20/12/2019 - 08h01 comentou:

Eu aprendi a andar de bicicleta com 51 anos…quer dizer, ainda estou aprendendo rs estou com 55 agora.

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Horacio em 20/01/2020 - 11h53 comentou:

Cynara
Ora, todo mundo concorda com DH Lawrence, ¨a beleza é o choque que a paixão provoca¨. E citando o Chico Buarque digo que ¨tua beleza é quase um crime¨.
H

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Anonimo em 25/07/2021 - 17h17 comentou:

O problema é que se um homem opina no vestuário de uma mulher ele é taxado de machista. Se ele não quer que uma mulher use um determinado tipo de roupa ele é taxado de machista. Agora se um homem usa uma regata em um encontro ou uma bermuda ele é taxado de desleixado, ou seja as mulheres podem opinar no que vestimos, mas nós homens não. Elas logo já vem com o ditado “meu corpo minhas regras”. Agora se um homem faz o mesmo ele é um coitado desleixado. Tipo elas podem usar e abusar do que quiserem. Nós homens não. Somos obrigados a aceitar sair com uma mulher de regata, short curto, cropped. Agora se queremos sair de regata não podemos. Francamente, vcs mulheres chegam a ser mais machistas que nós de vez em quando. Argumentar que o homem não é assediado por usar um short no tamanho do comprimento que vcs mulheres usam é uma inverdade. Agora se acham que não somos assediados, somos sim inclusive por vcs mulheres. Não é justo vcs usarem a roupas que vcs quiserem e nós não. Portanto usaremos o que quisermos sem a opinião imatura e femista (machista) de vocês.

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Anonimo em 25/07/2021 - 17h18 comentou:

Quero ver se não ter regra para os homens.

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    Cynara Menezes em 26/07/2021 - 14h52 comentou:

    pela gente, vocês usariam saia, inclusive. bem mais fresquinho

Rita de c n de oliveira em 12/01/2022 - 10h57 comentou:

Excelente matéria parabéns eu tenho cinquenta anos e quem faz minhas regras como se vestir sou eu o resto não mim importo Desde que eu gosto do que vejo no espelho as opiniões de outros desconsidero

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Maria goretti nobre em 05/03/2022 - 03h32 comentou:

Era um terceiro encontro com uma pessoa especial em uma terça de Carnaval, um sol a pino a tarde, eu 63 anos, um corpo razoável, pernas bem bronzeadas, resolvi ir com um shortinho jeans e blusa canelada de um ombro só, repito tenho um corpo normal, sem gordurinhas, muito calor e me sentia perfeitamente bem.Porem a pessoa com qual sair não aceitou e disse que eu não me vestia de acordo com a minha idade, ele com 55 anos com aparência e cabeça mais velha que a minha.

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Luciene em 14/03/2022 - 03h19 comentou:

Não cheguei aos 50, mas tô quase lá- tenho 47 – e desde o início da pandemia parei de colorir os cabelos. Primeiro foi por causa do fechamento dos salões de cabeleireiro, depois gostei da sensação de voltar a ter o cabelo virgem. É mais macio, saudável, e me sinto autêntica, não uma pessoa que fazia algo por causa da opinião alheia. Já recebi críticas e estou igual a pato, ca… e andando.

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Anônimo em 17/03/2022 - 14h20 comentou:

Gente , e somente eu q não consigo aceitar essas regras impostas pela sociedade? Afinal q regras são essas? Na.minha vida tudo aconteceu ou cedo demais,ou muito tarde. Casei cedo fui infeliz p mais de 20 anos, pq vivi um casamento abusivo, mulher não podia trabalhar, eu não tinha como me sustentar , minha mãe me julgava sobem tocar no assunto, aos 40 anos consegui separar, oi seja ele arrumou outra c idade p ser filha dele. Terminei meu ensino médio, arrumei .emprego de recepsionista, encontrei uma pessoa maravilhosa, um anjo q Deus pós no.meu caminho, aos 46 anos de idade engravidei, sim mãe aos 46 anos. Loucura? Não acho vivi cada segundinho, me senti a adolescente q me foi roubada aos 16 anos de idade. Veio a pandemia, fui demitida. Acabei de completar 50 anos e agora me deparo com tantas coisas . NAO PODE
NAO PODE
NAO PODE
Gente não quero me vestir como uma adolescente, não quero ter cabelos longos , não quero viver como uma menininha, não quero usar roupas apertadas… Só quero poder trabalhar criar meu filho, me sentir útil. E pedir demais?
Eu sei que posso, eu estou viva, a impressão q tenho e que a sociedade em si impõe q a vida acaba aos 50 anos.
Tô muito mal, angustiada , depressivo c crises de anciedade , tudo pq estou me sentindo impotente.
Desculpe o desabafo.
Tá difícil aceit

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Anônimo em 10/11/2022 - 05h21 comentou:

Matéria extraordinária Tenho 52, sem filhos sem marido, trabalhando, faço atividade física, cheia de planos e projetos. A liberdade em todos os sentidos sempre foi uma das coisas mais importantes da minha vida, porém, o fato é que a sociedade, família e amigos, sempre tentam nos podar e impor nos regras. Hoje é fácil eu olhar para trás e perceber o quanto deixei viver tudo o que eu queria e poderia, ao ter aceitado ou permitido tais imposições. Agora sim, sinto me maravilhosa e dona de mim, hoje posso e faço tudo o que eu quiser! Homens, homens… Sempre nos respeitando, vocês podem o que quiserem. Acredito que homens e mulheres inteligentes acabam tendo percepções semelhantes na mesma faixa etária. Ahh, só para confirmar, sempre fui, sou e serei belíssima fisicamente e mentalmente…

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Maria Braga em 05/01/2023 - 20h03 comentou:

A modelo ficou linda com o bustie, deve ter causado inveja em quem teceu crítica tão inoportuna. Estou nos 60, não sou nenhuma modelo, mas uso tudo o que quero, contanto que me sinta bem e não fique ridículo. Uso roupas super joviais e com certeza fico muito bem imagina uma modelo linda dessa.

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