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Fernández assume e Macri sai, deixando 40,8% na pobreza e uma explosão de memes

Um balanço do governo neoliberal que termina deixando mais de 4,5 milhões de novos pobres na Argentina

Macri passa o bastão a Alberto Fernandez. Foto: reprodução twitter
Martín Fernández Lorenzo
10 de dezembro de 2019, 16h53

A única saudade que Mauricio Macri vai deixar é a profusão de memes que gerou em quatro anos de uma presidência desastrada, cuja herança principal é a de 40,8% de argentinos na pobreza. Nesta terça-feira, dia da posse do novo presidente, Alberto Fernández, a internet quebrou com memes zoando Macri.

Cinco dias antes de deixar o poder, Macri teve a cara-de-pau de aparecer em cadeia nacional de televisão para destacar todas as “conquistas” de seu governo. E, como sempre nestes quatro anos, se esmerou em mentir, sem vergonha alguma das barbaridades que estava comunicando ao povo argentino.

“Foi graças às nossas medidas e aos esforços de todos os argentinos que em 2015 pagaram 15% do custo de sua conta de gás e agora pagam cerca de 80%”, afirmou. É realmente incrível que um presidente enfatize que ter aumentado não apenas a tarifa do gás como a de todos os serviços abruptamente seja uma “conquista” do governo, transferindo indiretamente o salário dos trabalhadores para as multinacionais.

Em 2018, a projeção do ministro da Fazenda, Nicolás Dujovne, era de 15,7% de inflação, e chegou a 47,6%, patamar mais alto dos últimos 27 anos. Mas, no início de 2019, o presidente disse que a inflação estava caindo, para espanto e riso dos adversários

No entanto, o mais absurdo foi Macri ter se gabado por ter “melhorado a qualidade de vida dos aposentados”, que sofreram uma perda de poder de compra de 18%. Embora sua mensagem tenha conseguido despertar toda a indignação da oposição, horas antes havia sido divulgada a notícia triste que há dois meses atrás havíamos antecipado: Macri deixa a Argentina com uma pobreza de 40,8% .

A UCA (Universidade Católica Argentina) divulgou alguns índices que, embora esperados, são devastadores: 40,8% dos argentinos estão na pobreza e 8,9% em extrema miséria. Mas os dados mais graves são aqueles entre crianças e adolescentes de 0 a 17 anos: 59,5% na pobreza. 14,8% em extrema miséria. Ou seja, 6 em cada 10 meninos na Argentina são pobres.

Segundo o jornal Clarín, a “crise”, que na realidade foi o próprio Macri que desencadeou, deixa mais de 4,5 milhões de novos pobres no país, algo muito distante do que dizia em campanha, prometendo “Pobreza Zero”. Outra questão preocupante é a inflação. Em 2018, a projeção do ministro da Fazenda, Nicolás Dujovne, era de 15,7%; chegou a 47,6%, patamar mais alto dos últimos 27 anos.

No início de 2019 e após essa inflação descontrolada, na abertura das sessões extraordinárias do Congresso, o presidente disse que a inflação estava caindo, para o espanto e o riso dos adversários. Para este ano, eles projetam 23% de inflação e, em dez meses, o número já é de 42,2%, portanto será um recorde sobre o recorde anterior. Há algum ministro no mundo que “errou” 30 pontos em suas projeções por dois anos consecutivos?

Dujovne renunciou poucas semanas antes de terminar o mandato do chefe. Em 2016, ele havia zombado da oposição em um programa de TV, com um cartaz garantindo que o país nunca iria voltar ao FMI. E voltou, após 15 anos. Sinistro.

Mas o governo Macri não foi só ruim em termos econômicos. Acabou com os ministérios do Trabalho, da Saúde e da Ciência, entre outros, e foi um desastre em matéria de direitos humanos. Reprimiu manifestações e recebeu na Casa Rosada um policial acusado de homicídio agravado ao disparar contra um ladrão pelas costas, o que serviu como precedentes para casos similares de violência policial, como os assassinatos de Facundo Ferreira, de 12 anos, e Rafael Nahuel, de 22.

O governo Macri não foi só ruim em termos econômicos. Acabou com os ministérios do Trabalho, da Saúde e da Ciência, entre outros, e foi um desastre em matéria de direitos humanos

Houve ainda o caso de Santiago Maldonado, de 28 anos, que ficou desaparecido por 70 dias após participar de uma manifestação em favor dos índios mapuche, até ser encontrado morto, supostamente afogado, mas com suspeitas de que tenha sido vítima da repressão. A investigação ainda está em andamento.

Macri também foi um negacionista da ditadura, se mostrando indiferente a eventos como “La Noche de los Lápices”, celebrada todo ano para lembrar o desaparecimento de estudantes na ditadura. O presidente foi inimigo público das Mães e Avós de Plaza de Mayo e, numa entrevista, chamo o regime militar de “Guerra Suja”, um grave insulto à memória dos 30 mil desaparecidos e seus familiares.

O governo nunca cumprimentou as Avós de Plaza de Mayo nas últimas restituições dos netos roubados pela ditadura e não dedicou nem uma só palavra sobre a indicação delas ao Nobel da Paz. Estela de Carlotto, presidenta do movimento, declarou: “Se aguentamos Videla, vamos aguentar Macri”.

Como fazem os bolsonaristas, também os macristas disseminavam 3 ou 4 notícias ou declarações controversas por dia enquanto se concentravam em seu real objetivo, transferir recursos dos mais pobres para os mais ricos

Deve-se notar que, mesmo com os números provando ter sido o pior governo desde o retorno da democracia, graças ao ódio ao peronismo/kirchnerismo inculcado na população pelos meios de comunicação, o presidente ainda alcançou um assombroso 40% de votos em sua tentativa de reeleição. Olhando os resultados, percebe-se que colocar Cristina Kirchner na vice em vez da cabeça de chapa foi uma jogada de xadrez sensacional. Se ela tivesse saído à presidência, provavelmente perderia. Macri se tornou, assim, o primeiro presidente após a ditadura que perde ao tentar se reeleger.

Está de saída um governo que transformou nosso dia a dia em um pesadelo sem fim, e contamos literalmente os dias para que terminasse. Vejo muitas semelhanças entre Macri e a realidade do Brasil com Bolsonaro. Como fazem os bolsonaristas, também os macristas disseminavam 3 ou 4 notícias ou declarações controversas por dia enquanto se concentravam em seu real objetivo, transferir recursos dos mais pobres para os mais ricos. Ambos são governantes opressores, que não apenas geram pobreza, mas deprimem seu povo, deixando-o paralisado diante de um horror que se normaliza.

Alberto e Cristina na posse. Foto: divulgação

Uma das decisões mais graves de Macri foi o corte brutal nos recursos para as pessoas com deficiência, que tiveram que marchar várias vezes para lutar pelo seus direitos. Na primeira marcha, em 2016, quando o governo cortou suas pensões, eu assisti e percebi, ao ver que estavam totalmente sozinhos em sua reivindicação, que se um povo permite ou é indiferente a um ataque às camadas mais frágeis da sociedade, podem fazer tudo conosco. E assim aconteceu.

Agora eles partiram. Tomando o lema das Mães e Avós da Plaza de Mayo: “Nem esquecimento. Nem perdão”. Que venham Alberto e Cristina.

(Enfatizo que todas as fontes usadas neste texto são de jornais que apoiaram o governo Macri, para mostrar que a realidade é tão ruim que não pode ser acobertada.)

 


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