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Risco Brasil: com Bolsonaro, país é o vizinho infectado que ninguém quer por perto

Governos de esquerda e direita vigiam as fronteiras para que o descontrole brasileiro com o coronavírus não afete seus cidadãos

Ilustração: Renato Aroeira
Martín Fernández Lorenzo
12 de maio de 2020, 19h27

Desde que a Argentina impôs quarentena obrigatória, em 20 de março, houve 6.278 casos e 317 mortes por Covid-19 no país. Se compararmos com o Estado de São Paulo, que tem população quase idêntica (cerca de 45 milhões), a diferença é brutal: São Paulo tem 7 vezes mais casos de coronavírus que a Argentina e 12 vezes mais mortos. Atualmente o Brasil é o campeão em Covid-19 de toda a América Latina e possui a pior taxa de crescimento de letalidade da América do Sul.

Se compararmos os números a nível de país, o Brasil, com uma população cinco vezes maior que a Argentina, registra 27 vezes mais casos e 37 vezes mais mortes. Os números não fecham, nem se levarmos em consideração que o Brasil possui uma densidade demográfica mais alta: 25 habitantes por km² contra 16 da Argentina. A cada milhão de habitantes, o Brasil possui 809 casos e a Argentina 139,5. No entanto, a mortalidade é de 55,6 por milhão no Brasil e de apenas 7 por milhão na Argentina. Fica claro que, embora a maioria dos governadores tenha agido corretamente, o governo federal deveria ter adotado medidas ainda mais drásticas do que o governo argentino em vez de optar pelo descaso com a doença.

Com 12 mil mortos no país até o momento, viramos aquele vizinho indesejado (e infectado) que nenhum país da região quer ter por perto, inclusive os governados pela direita. Pela esquerda, o presidente argentino, Alberto Fernández, tem sido o mais duro nas críticas ao comportamento desleixado de Bolsonaro. “Há muitos caminhões de carga que vêm a nosso país de São Paulo, lá o foco infeccioso é altíssimo e parece que o governo não está encarando com a seriedade que o caso requer. Isso me preocupa muito pelo povo do Brasil, mas também porque pode se transferir para a Argentina. Já falei com Piñera (Chile) e com Lacalle (Uruguai), é claro que o Brasil representa um risco”, disse Fernández.

Também os presidentes do Paraguai, Marito Abdo, e do Uruguai, Lacalle Pou, ambos de direita, têm demonstrado preocupação que o Brasil seja um foco de infecção para seus cidadãos. Abdo esteve pessoalmente na Ponte da Amizade, principal ligação entre os dois países, em Ciudad del Este, para garantir que as fronteiras estejam reforçadas. Ônibus e automóveis com brasileiros são barrados e os paraguaios que entram vão para a quarentena obrigatória, em albergues do governo.

“Com o que o Brasil está vivendo, não passa por nossa cabeça a reabertura das fronteiras, já que talvez seja um dos lugares onde há maior circulação da Covid-19 e isso é uma grande ameaça para nosso país”, disse o presidente. “Já reforcei, militarizei as zonas mais vulneráveis e com maior volume de gente para fazer todo o esforço para diminuir a possibilidade de que ingressem pessoas vindas do lado brasileiro que não respeitam os protocolos.”

O Paraguai tem 737 pessoas infectadas e 10 mortos para uma população de 7 milhões de pessoas, um dos índices mais baixos da região. “No nosso país, os casos da doença são importados, vieram de vários lugares, mas principalmente do Brasil”, disse o vice-ministro de Atenção Integral à Saúde e Bem-Estar Social, Juan Carlos Portillo Romero, à BBC Brasil.

Jornal paraguaio chama o Brasil de “principal ameaça”. Foto: reprodução

Lacalle Pou fez o mesmo: aumentou o controle sanitário em sua fronteira, alarmado com a explosão de casos de coronavírus no lado brasileiro. “O governo do Uruguai está preocupado com a situação que estão vivendo algumas localidades fronteiriças, particularmente do lado brasileiro”, disse o ministro Álvaro Delgado. Com uma população de 3,4 milhões de pessoas, o Uruguai tem pouco mais de 700 casos de coronavírus e 19 mortos até agora.

O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, chamou Bolsonaro de “coronalouco” e anunciou o fechamento das fronteiras terrestres com o Brasil. “Bolsonaro não tem limites, é um coronalouco, e o pior é que afeta a vida do povo, sua estabilidade. Com sua irresponsabilidade levou milhares de brasileiros a se infectar, levou milhares de seus compatriotas à morte”, criticou Maduro. A Venezuela possui cerca de 29 milhões de habitantes, tem 422 infectados pelo coronavírus e 10 mortes registradas.

E na Argentina, o que deu tão certo? É simples: a quarentena não pode ser imposta pela força. Se as pessoas tivessem que escolher entre se isolar ou passar fome, é claro que não funcionaria. O isolamento social só se tornou factível porque o presidente Fernández aliou a quarentena obrigatória com medidas de proteção social. Atualmente, o que preocupa mais é a situação das favelas da cidade de Buenos Aires, governada por Horacio Rodriguez Larreta, que já superam os 500 casos.

Mesmo sendo elogiado no mundo pelo sucesso obtido, os ataques ao presidente Alberto Fernández dobraram desde que ele decidiu debater o imposto sobre grandes fortunas no país. Na semana passada, instalaram na mídia a falácia de que, com a desculpa da pandemia, o Executivo estava libertando assassinos e estupradores, embora na verdade isso seja tarefa do Judiciário. Ainda assim, se comprovou que o número de prisioneiros libertados foi inferior ao de 2019.

Dia e noite economistas perambulam por todos os programas e meios de comunicação pedindo o fim do isolamento e a priorização da economia. Alguns chegam ao ridículo de destacar o modelo econômico brasileiro como exemplo e ameaçam romper o isolamento. Os empresários estão furiosos e os meios de comunicação argentinos estão fazendo um papel deplorável tentando sabotar a quarentena.

Setores da oposição imitam os bolsonaristas e chegaram a convocar uma marcha para 7 de maio com o slogan “Não queremos o comunismo”, que foi um fracasso. Também copiando o que ocorreu no Brasil, acusaram os 202 médicos cubanos que iriam apoiar o combate na província de Buenos Aires de serem “espiões”. Os médicos nem sequer chegaram ao país, porque a situação é mais estável do que se previa.

Hoje o governo argentino tem dois inimigos claros: a pandemia e os poderosos setores econômicos que, com o apoio da mídia, não aceitam ou perdoam a mensagem clara de Fernández, que desde o primeiro dia, lhes advertiu: “É hora de ganhar menos”. O presidente voltou a estender a quarentena até o dia 24 de maio e avisou aos empresários que tentam desestabilizá-lo: “Sei o que tenho que fazer para defender os direitos dos argentinos e foi isso que os argentinos me delegaram. Lutarei contra aqueles que precise lutar. Não vão torcer meu braço”.

 


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