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The Lancet: como os países ricos sabotaram a estratégia global de vacinação

Países como os EUA e o Reino Unido preferiram fechar acordos bilaterais com as companhias farmacêuticas e garantir seu próprio estoque

Vacinação contra a Covid-19 em Gana, em março deste ano. Foto: USAID
Da Redação
22 de junho de 2021, 21h01

Um artigo publicado no sábado, 19 de junho, pela prestigiosa revista científica britânica The Lancet mostra como os países ricos sabotaram a estratégia global de vacinação do consórcio COVAX Facility, iniciativa criada em abril de 2020 pela OMS (Organização Mundial de Saúde) para ampliar o acesso igualitário à imunização contra a Covid-19 no mundo e garantir que os países mais pobres não ficassem de fora da vacinação. A ideia era reduzir a desigualdade na aquisição de vacinas com a distribuição de 2 bilhões de doses até o final de 2021, sem distinguir quais países tinham condições de pagar ou não por elas.

“Era um programa bonito, nascido da solidariedade, mas infelizmente não se concretizou. Os países ricos se comportaram pior do que nossos piores pesadelos”, disse Gavin Yamey, pesquisador da Duke University que atuou na criação do consórcio, à autora Ann Danaya Usher, que publicou o artigo sob o título A beautiful idea: how COVAX has fallen short (Uma ideia bonita: como a COVAX fracassou).

“Era um programa bonito, nascido da solidariedade, mas infelizmente não se concretizou. Os países ricos se comportaram pior do que nossos piores pesadelos”, disse Gavin Yamey, pesquisador que atuou na criação do consórcio COVAX

A explicação para o fracasso, segundo a revista, é que os países ricos, em vez de se comprometerem com a iniciativa, preferiram fechar acordos bilaterais com as companhias farmacêuticas e garantir seu próprio estoque. “Farinha pouca? Meu pirão primeiro”, como diria um brasileiro. Os EUA, por exemplo, em agosto de 2020 já tinham conseguido fechar acordos com seis empresas e garantido para os norte-americanos 800 milhões de doses de vacina, suficientes para vacinar 140% da população. O Reino Unido, por sua vez, fechou cinco acordos que permitiriam vacinar 225% de seus habitantes.

“Hoje, dez países administram 75% de todas as vacinas contra a Covid-19, mas, nos países pobres, os profissionais de saúde e as pessoas com doenças subjacentes não podem acessá-las. Isso não é apenas injusto, é também contraproducente”, alertou o secretário-geral da ONU, António Guterres, conforme citado na The Lancet. “A COVAX distribuiu mais de 72 milhões de doses em 125 países, mas isso é muito menos do que os 172 milhões que deveria ter entregue até agora.” Dos 2,1 bilhões de doses da vacina contra a Covid-19 administradas em todo o mundo até agora, o COVAX foi responsável por menos de 4%.

Em agosto de 2020 os EUA já tinham fechado acordos com seis empresas e garantido 800 milhões de doses de vacina, suficientes para vacinar 140% da população. É por isso que agora Joe Biden pode posar de “amigão do mundo” doando vacinas, inclusive ao Brasil

É por isso que agora Joe Biden pode posar de”amigão do mundo” doando o excedente a países da América Latina, inclusive o Brasil. A sobra das vacinas também tem servido para o presidente dos EUA fazer proselitismo contra a China: doou 2,5 milhões de doses contra a Covid-19 a Taiwan, o que foi recebido pelo governo chinês como uma provocação. Zhao Lijian, porta-voz do Ministério das Relações Exteriores da China, criticou o uso das vacinas para “manipulação política” pelos estadunidenses. Aliado aos EUA, o governo da ilha havia recusado as ofertas de vacinas chinesas.

Segundo o pesquisador Yamey, era esperado que os países ricos fechassem acordos bilaterais, mas que também comprassem da COVAX como garantia, em caso de algumas se provassem ineficazes. No final, “três dúzias de países driblaram a COVAX e fecharam acordos gigantescos diretamente com os fabricantes. Deram sorte que as vacinas funcionaram. E como eles limparam as prateleiras, não sobraram doses suficientes para a COVAX”, disse Yamey à Lancet.

Leia o artigo na íntegra aqui.


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