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Feminismo

Um Dia Internacional da Mulher com as mulheres negras (e Dilma) como protagonistas

"Depois de 6 anos, o 8 de março volta a ser celebrado com políticas públicas para as mulheres neste país", disse a ministra Cida Gonçalves

Lula e Selma Dealdina, da Marcha das Mulheres Negras. Foto: Ricardo Stuckert/PR
Cynara Menezes
08 de março de 2023, 18h44

Tinha cor-de-rosa. Mas também tinha amarelo, vermelho, azul, laranja, lilás. E tinha preto. Ou melhor, preta, mulher preta. As mulheres negras foram as protagonistas do Dia Internacional da Mulher no Palácio do Planalto, o primeiro 8 de Março que se preza desde que a primeira mulher presidenta do Brasil foi arrancada do poder por um golpe impregnado de misoginia, em 2016. Dilma Rousseff, aliás, também foi protagonista, lado a lado com Marielle Franco, personificada na figura de sua irmã, Anielle, ministra da Igualdade Racial.

Lula não parecia estar nem um pouco incomodado pelo brilho da sucessora (e agora antecessora), ovacionada logo ao descer a rampa interna do Palácio para a cerimônia. Pelo contrário, tinha o semblante orgulhoso, contente. Já no segundo andar, Dilma seria saudada pelas mulheres da plateia em coro, de forma emocionada, com a velha cantiga dedicada a Lula e que foi adapatada para ela desde 2010: “Olê, olê, olê, olá, Dilma, Dilma”.

Nada mais simbólico, depois dos anos sombrios em que “meninas vestem rosa e meninos vestem azul”, que o Hino Nacional tenha sido cantado justamente por uma mulher negra, a ministra da Cultura, Margareth Menezes.

A representante da Marcha das Mulheres Negras, Selma dos Santos Dealdina, resumiu o sentimento geral de retomada do território após a triste era em que quilombolas, como ela própria, eram tratados pelo ocupante da presidência da República como animais que se pesam em arrobas e não servem nem para procriar. “Presidenta Dilma, é muito bom vê-la neste espaço de onde a senhora foi arrancada”, disse Selma, provocando nova ovação.

“Nós reocupamos esse lugar e é muito bom estar neste lugar de novo, depois de 6 anos sendo praticamente impedidas de entrar neste lugar. Ver este lugar repleto de mulheres é muito importante. Estamos de volta. A partir de agora nem um passo atrás, e o Brasil é nosso, é do povo, é das mulheres negras, é do povo brasileiro”, comemorou.

“Presidenta Dilma, é muito bom vê-la neste espaço de onde a senhora foi arrancada”, disse Selma, da Marcha das Mulheres Negras. “Nós reocupamos esse lugar e é muito bom estar neste lugar de novo, depois de 6 anos sendo praticamente impedidas de entrar. Estamos de volta. A partir de agora nem um passo atrás, e o Brasil é nosso, é do povo, é das mulheres negras”

“Marielle, justiça! Marielle, justiça!”, reagiu a plateia ao final do discurso de Selma. Uma das 28 iniciativas anunciadas pelo governo foi a instituição do dia 14 de março, dia do assassinato da vereadora e de seu motorista Anderson Gomes em 2018, como Dia Marielle Franco de Enfrentamento à Violência Política de Gênero e de Raça. Outras mulheres negras célebres foram homenageadas nos nomes dos novos programas de incentivo na área da Cultura: o Edital Ruth de Souza de Audiovisual e o Prêmio Carolina Maria de Jesus de Literatura.

Por que o protagonismo às mulheres negras? Ora, segundo o IBGE, 63% das casas brasileiras lideradas por mulheres negras estão abaixo da linha de pobreza. 32% das jovens negras entre 15 e 29 anos estão sem estudo e sem trabalho. O índice de desemprego entre as mulheres negras é o dobro do índice de desemprego dos homens brancos. A mulher negra sofre ainda com a perda dos filhos, irmãos, companheiros, para a violência policial –84% dos mortos pela polícia são homens negros– e são as mulheres negras as principais vítimas de feminicídio. Não resta dúvida que são, entre todas as mulheres, as negras que mais precisam das políticas públicas. Nada mais justo que estejam no centro das ações adotadas pelo governo Lula.

A desigualdade salarial entre gêneros, por exemplo, alvo do projeto de lei que prevê Igualdade Salarial e Remuneratória entre Mulheres e Homens enviado pelo presidente ao Congresso, atinge mais fortemente as mulheres pretas e pardas. Segundo pesquisa divulgada neste 8 de Março, embora 34% das mulheres negras entre 25 e 44 anos em São Paulo tenham curso superior, contra 27% dos homens brancos na mesma faixa etária, elas ganham metade do salário que eles recebem: a média salarial de uma mulher negra no Estado é de 13,86 reais por hora, enquanto a de um homem não-negro é de 27,15 reais.

“Nada, absolutamente nada, justifica a desigualdade de gênero. A medicina não explica, a biologia não explica, a anatomia não explica. Talvez a explicação esteja no receio dos homens de serem superados pelas mulheres. E isso não faz sentido algum. Primeiro porque as mulheres querem igualdade, e não superioridade”, disse Lula

Se aprovada, a lei proposta pelo governo prevê multa para o empregador que não cumprir a obrigação de que homens e mulheres ocupando a mesma função ganhem salário idêntico. “A igualdade de gênero não virá da noite para o dia, mas precisamos acelerar esse processo”, justificou Lula. “A gente está dizendo em alto e bom som que, se trabalha na mesma função e exerce a mesma função com a mesma competência, a mulher tem o direito de ganhar o mesmo dinheiro que ganha um homem trabalhando. Vai ter muita gente que não vai querer pagar. Para isso, a Justiça tem que funcionar para obrigar o empresário a pagar aquilo que a mulher merece pela sua capacidade de trabalho.”

“Nada, absolutamente nada, justifica a desigualdade de gênero. A medicina não explica, a biologia não explica, a anatomia não explica. Talvez a explicação esteja no receio dos homens de serem superados pelas mulheres. E isso não faz sentido algum. Primeiro porque as mulheres querem igualdade, e não superioridade. E segundo porque quanto mais as mulheres avançam, mais o país avança, e isso é bom para toda a população”, disse o presidente.

Impossível não comparar com o discurso mofado de seu antecessor Jair Bolsonaro em 8 de março de 2022, quando, em vez de combater a desigualdade, afirmou que as mulheres estão “praticamente integradas à sociedade”. No palco, entre mulheres todas de camiseta rosa, Bolsonaro trocou a gravata por uma cor-de-rosa. Até a apresentadora da TV Brasil vestia uma blusa rosa. Patético. “Somos uma nação cor-de-rosa”, disse na época Damares Alves, que, bem a propósito, foi a única ex-ministra da Mulher a não ser saudada por Cida Gonçalves em seu discurso.

Lula foi o único homem a discursar no evento do Dia Internacional da Mulher. Em 2022, além de Bolsonaro, também discursou o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, acusado de assédio sexual e moral contra funcionárias. Hoje, pela primeira vez na História, quem está na presidência dos dois bancos públicos, Caixa e BB, são mulheres. É ou não é emblemático?

Cida homenageou todas as antecessoras presentes, menos Damares. Lembrou de Eleonora Menicucci (governo Dilma), Emilia Fernandes (primeiro governo Lula), Iriny Lopes (governo Dilma) e, in memoriam, Nicea Freire (governo Lula)… Nada mais justo do que o esquecimento para Damares, que se portou como ministra contra as mulheres muitas vezes, como quando tentou impedir uma menina de 10 anos vítima de estupro de fazer o aborto a que tinha direito por lei.

Lula foi o único homem a discursar no evento do Dia Internacional da Mulher nesta quarta-feira no Palácio do Planalto. Em 2022, além de Bolsonaro, também discursou o presidente da Caixa Econômica Federal, Pedro Guimarães, acusado de assédio sexual e moral contra funcionárias, gerando um prejuízo à instituição, que terá de pagar 10 milhões de reais de multa por dano coletivo ao Ministério Público do Trabalho. Hoje, pela primeira vez na História, quem está na presidência dos dois bancos públicos, a Caixa e o Banco do Brasil, são mulheres. É ou não é emblemático?

Como disse Cida Gonçalves: “Depois de 6 anos, o 8 de março volta a ser celebrado com políticas públicas para as mulheres neste país”. Aleluia.

 


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