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Revista da Universidade de Columbia detona El Pais por cobertura da crise catalã

Jornal espanhol é acusado de censurar artigos críticos ao governo, demitir colunistas e de ter se tornado chapa-branca para conseguir renegociar sua dívida bilionária

Redação do El Pais em Madri. Foto: divulgação
Da Redação
04 de novembro de 2017, 12h48

Uma das mais prestigiosas revistas universitárias da área de jornalismo, a Columbia Journalism Review, editada desde 1961 pela Universidade de Columbia, publicou um artigo detonando o jornal espanhol El Pais pela cobertura enviesada pró-governo que tem feito do movimento independentista catalão. “Mais famoso jornal da Espanha tropeça na crise da independência da Catalunha”, diz a manchete.

O texto abre com a história da demissão do colunista britânico John Carlin, que escrevia no jornal havia quase 20 anos, após publicar um artigo em outro jornal, o Times londrino, defendendo que a postura “arrogante” e “intransigente” do governo espanhol, de direita, é a grande responsável pelo impasse gerado desde a votação do referendo, em 1º de outubro. Sua última coluna no El Pais, El Brexit y el lío catalán (O Brexit e a confusão catalã), trazia duras críticas ao governo central e também ao papel da mídia.

Fui vítima de censura ideológica. A mesma censura que aplicaram ao companheiro de colunas Francesc Serés. Agora já limparam todas as opiniões dissonantes

“Qualquer um vê que os independentistas não conseguiriam a metade dos seus objetivos sem a ajuda do partido que governa a Espanha e seus correligionários na mídia. Acusam os independentistas de serem crianças irresponsáveis e birrentas sem ver que eles, acreditando-se adultos, se comportam igual”, dizia a coluna. Outros dois colunistas, o historiador catalão Joan Culla e o escritor aragonês Francesc Serés, da Universidade de Barcelona, deixaram o jornal afirmando haverem sido “censurados” por suas críticas ao governo de Madri.

“Fui vítima de censura ideológica. A mesma censura que aplicaram ao companheiro de colunas Francesc Serésque também abandonou o diário esta semana. Agora já limparam todas as opiniões dissonantes. A limpeza ideológica já é total”, declarou Culla ao jornal digital El Món. O El Pais censurou um artigo de Culla que deveria sair no início do mês na edição catalã em que apontava o passado falangista de Juan Luis Cebrián, o presidente do grupo Prisa, que edita o diário. “A censura foi aplicada pelos que dizem que somos nós os intolerantes e censores ideológicos, enquanto eles são defensores do pluralismo.”

De acordo com a Columbia Journalism Review, as demissões são uma evidência da parcialidade que o El Pais assumiu em relação ao governo e ao desejo de independência dos catalães. “A abrupta demissão de Carlin, cujo contrato ia até 2018, provocou acusações de que o mais famoso jornal da Espanha está fazendo limpeza ideológica e fortaleceu a versão de que Madri está ajudando o financeiramente abalado jornal a levantar dinheiro para se salvar”, diz o artigo.

O grupo Prisa tem a pior performance entre todos os grande grupos de mídia da Europa atualmente, e os rumores são de que o El Pais virou chapa-branca em troca de ajuda do governo junto aos bancos para renegociar uma dívida de pelo menos 1,5 bilhão de euros. Na semana passada, o site El Español publicou um artigo em que revela a simbiose do diário com o governo, a ponto de a vice-presidenta de governo Soraya Sáenz de Santamaría (não por coincidência designada interventora na Catalunha) ter atuado para impedir Cebrián de ser substituído por alguém que ela não desejava.

Segundo John Carlin, o colunista demitido, o jornal espanhol hoje em dia “divide a cama” com a classe política madrilenha

“É muito frustrante para muitas pessoas o que aconteceu com o grupo Prisa”, disse à Columbia Review a professora de Comunicação Nuria Almiron, da Universidade Pompeu Fabra em Barcelona. “Eles realmente caíram nas mãos das elites financeiras, que são naturalmente próximas das elites políticas. Eles precisam de ajuda dos bancos, e este é o preço.” Segundo John Carlin, o colunista demitido, o jornal espanhol hoje em dia “divide a cama” com a classe política madrilenha.

O autor do artigo, Marc Herman, lamenta que a “suspeição” tenha deixado os leitores órfãos de informação equilibrada sobre a situação na Catalunha. O editor do jornal, David Alandete, negou a Herman que a demissão de Carlin esteja ligada às suas opiniões contra o governo. “Fake news. Não há contato entre a parte editorial e a comercial. Este é um jornal privado e não acho que uma empresa privada precise explicar por que terminou uma parceria com algum contratado”, disse. No entanto, o próprio Alandete é acusado de publicar fake news em um artigo onde acusa independentistas de “roubarem” munição da polícia, desmentido pela mesma polícia.

Em comum com o jornal espanhol, a mídia nativa se diz “independente”, enquanto bajula o governo para conseguir sair da bancarrota

A Columbia Review relembra, porém, o histórico do jornal espanhol, feroz crítico da “ditadura” venezuelana, em mandar para a rua gente que não esteja de acordo com sua linha editorial, cada vez mais alinhada com quem esteja ocupando o poder. “O El Pais tem um histórico recente de retaliação contra colunistas e críticos. Em 2015, o jornal pôs fim a uma parceria com o New York Times após o jornal norte-americano publicar críticas de outro colunista de longa data do El Pais, Miguel Ángel Aguilar, que foi desligado.”

Na semana passada, outro colaborador frequente, o cientista político Jordi Matas Dalmases, lamentou no twitter que o jornal tenha censurado um artigo seu.

 

Na entrevista que causou sua demissão e a “guerra” entre o El Pais e o New York Times, Miguel Ángel Aguilar dizia que os “problemas financeiros” estão comprometendo a linha editorial do jornal. “Trabalhar no El Pais era o sonho de qualquer estudante espanhol, mas agora há pessoas tão exasperadas que estão saindo, algumas vezes inclusive com o sentimento de que a situação chegou a níveis de censura”, ele disse ao jornal norte-americano. A crise na Catalunha só agravou a guinada rumo ao mau jornalismo.

O endividamento comprometendo a linha editorial é uma velha canção nos ouvidos dos brasileiros. Que o diga o Estadão, que publicou um editorial garantindo que Temer NÃO compra o voto de parlamentares no Congresso, a despeito de o próprio jornal ter publicado reportagens afirmando o contrário. Em comum com o jornal espanhol, a mídia nativa se diz “independente”, enquanto bajula o governo para conseguir sair da bancarrota.

 

 

 


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(2) comentários Escrever comentário

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Jefferson em 05/11/2017 - 15h50 comentou:

El Pais e a TV3 da Catalunha são as faces da mesma moeda que é colocar as ideologias acima dos fatos.

Responder

Jefferson em 05/11/2017 - 15h57 comentou:

A Universidade de Columbia é uma das universidades americanas em que o senhor Sergio Moro realizou palestras e falou das “maravilhas” da Lava Jato.

Responder

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